Trevo-subterrâneo (Trifolium subterraneum L. | Família: Fabaceae) (Parte I / III)

Por: Carlos Aguiar, Francisco Mondragão Rodrigues, Nuno Simões, Ana Barradas, Teresa Carita, Carlos Alarcão e David Crespo, SPPF

Distribuição

A área de distribuição natural do trevo-subterrâneo estende-se pelo noroeste de África, oeste da Europa até aos sistemas dunares mais quentes da Holanda e do sul da Grã-Bretanha e da Irlanda. Prolonga-se por todo o sul da Europa de clima mediterrânico e submediterrânico, por várias ilhas do Mar Mediterrâneo, em torno dos Mares Negro e Cáspio, e pela Turquia, Síria, Israel, Jordânia, Iraque, Irão e Etiópia.

Em consequência de introduções involuntárias está presente nas ilhas da Madeira e Porto Santo (Arquipélago da Madeira), nas ilhas do Pico, Graciosa, S. Miguel e Stª Maria (Arquipélago dos Açores) e no Arquipélago Canário. Está também naturalizada, ou é cultivada noutras regiões extratropicais de verões secos, como sejam o sul da Austrália, a Nova Zelândia, o centro e sul do Chile, o sul da África do Sul e o ocidente dos Estados Unidos da América, onde se destacam os estados da Califórnia e do Oregão.

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Como distinguir no campo

Corpo vegetativo

O trevo-subterrâneo é uma planta anual, prostrada, com um sistema radicular relativamente pouco profundante. Até à entrada do inverno observam-se, com frequência, no colo das plantas, os restos dos glomérulos que continham as sementes. Protegido da competição de outras plantas, sob uma pressão intensa de pastoreio, diferencia numerosos caules axilares, frequentemente mais de 10, que irradiam, mais ou menos ramificados e rentes ao solo, a partir do colo.

Os folíolos das folhas são obcordados (com a forma de um coroação estilizado ao contrário) e densamente peludos (sobretudo na página inferior), de nervuras nítidas, por regra com uma marca d’água de cor clara impressa em forma de meia lua, complementada, ou não, por pequenas riscas ou pintas vermelhas e irregulares (Figura 2). As folhas, por si só, são suficientes para distinguir o trevo-subterrâneo das demais espécies, indígenas ou cultivadas, do género Trifolium (trevos).

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Os pecíolos, as estípulas e os caules podem ser glabros ou peludos. Este aspeto tem um grande interesse prático para distinguir cultivares (maior do que as marcas d’água). Por exemplo, a cv. Denmark, uma das cultivadas em Portugal, só tem pelos nas folhas.

Inflorescência, flores, frutificações e sementes

As flores surgem organizadas em pequenos capítulos com 2-6 flores férteis (mais frequentemente 3-4), na extremidade de um longo pedúnculo, inserido na axila de uma folha. O cálice é verde, maculado, ou não, de vermelho. As flores têm corolas brancas, por vezes rosadas, duas vezes mais longas do que o cálice. Finda a fecundação diferenciam-se os glomérulos (infrutescências), que tomam uma forma globosa.

Como adiante se explicita, o exterior dos glomérulos está revestido por flores estéreis. Cada glomérulo contém geralmente 3 a 4 frutos indeiscentes (que não libertam as sementes), mais ou menos envolvidos pelo cálice da flor, cada um com uma única semente.

Em termos botânicos, o fruto dos trevos é um aquénio, e não uma vagem como acontece na maioria das leguminosas. As sementes do trevo-subterrâneo são invulgarmente grandes e pesadas para um trevo: rondam as 180.000/kg, variando de 160.000 a 220.000/kg. A cor das sementes tem, como ser verá, um grande interesse para distinguir subespécies.

Variabilidade e melhoramento

A variabilidade das populações naturais de trevo-subterrâneo, a matéria prima dos melhoradores de plantas, é notável. Zohary & Heller (The Genus Trifolium, 1984) reconhecem oito variedades no âmbito desta espécie. As plantas indígenas e cultivadas em Portugal cabem em três grandes grupos, isolados por fortes barreiras de esterilidade (J. Katznelson, Isr. J. Bot. 23, 1974), consoante os autores tratados ao nível da variedade, subespécie ou espécie.

Aceitemos a categoria de subespécie (subsp.) (Figura 3).

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A subsp. subterraneum apresenta cálices longitudinalmente estriados e sementes negras a vermelho muito escuro. Suporta com dificuldade solos encharcados. Entre as três subespécies citadas é a mais eficiente a enterrar as sementes no solo.

A subsp. yanninicum tem cálices enrugados transversalmente e sementes grandes, de cor clara (café-com-leite a beges, Figura 4). Produz plântulas de assinalável dimensão. Das três subespécies é a mais adaptada a solos mal drenados, frequentemente encharcados. As cultivares comerciais têm uma origem balcânica. As populações indígenas são francamente raras.

Os frutos maduros da subsp. brachycalycinum apresentam-se parcialmente cobertos (no máximo até metade) pelo tubo do cálice (daí o restritivo brachycalycinum). Nas subsp. subterraneum e yanninicum o tubo do cálice cobre mais de metade do fruto. Os cálices das flores estéreis são desiguais (diferentes uns dos outros), os mais externos não alcançando a metade do glomérulo maduro. Os pedúnculos são muito compridos e geralmente não chegam a enterrar os glomérulos no solo. As sementes são violáceas, algo comprimidas lateralmente (Figura 4). Esta subespécie está adaptada a solos de reação neutra a básica, ou a solos argilosos (que fendilham no verão). Todavia prospera também em solos sub-ácidos, de pH >5,6, desde que bem drenados.

Nas pastagens seminaturais de trevo-subterrâneo, a sul do Tejo, predomina a subsp. brachycalycinum. A norte do Tejo, com excepção do maciço calcário estrenho, domina a subsp. subterraneum. Por uma questão de prioridade nas datas de publicação, a subsp. brachycalycinum deve agora ser designada por subsp. oxaloides.

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A domesticação do T. subterraneum é recente: a primeira cultivar comercial – a cv. Mount Barker – foi colocada no mercado em 1907, na Austrália. As características mais trabalhadas pelos melhoradores no trevo-subterrâneo são a duração do ciclo de vida, a produtividade, a resistência a doenças, o teor em compostos antinutricionais com atividade estrogénica e a dormência tegumentar (produção de sementes duras). Como sempre acontece em melhoramento de plantas, as cultivares mais produtivas são as mais exigentes em fertilidade do solo.

A Austrália continua a ser o maior produtor mundial de sementes e a liderar o melhoramento desta importantíssima espécie pratense. Nas últimas décadas têm-se intensificado os trabalhos de melhoramento da espécie em Itália, Espanha e Portugal sendo já várias as cultivares obtidas nestes países, ainda que a produção de sementes continue concentrada na Austrália.

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