Produção precoce e tardia de Mirtilo em substrato

Por: Catarina de Oliveira Parente1, Pedro Brás de Oliveira2 e Cristina M. Oliveira1
1Instituto Superior de Agronomia, Tapada da Ajuda 1349-017 Lisboa
2Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária, I.P., UEIS-SAFSV, Av. da República Nova Oeiras, 2784-505 Oeiras

A cultura do mirtilo tem vindo a ganhar um interesse crescente por parte de consumidores e produtores. As suas qualidades organoléticas e os benefícios que o seu consumo traz para a saúde têm provocado uma procura crescente pelos pequenos frutos, em fresco, e em especial pelo mirtilo (Figura 1). A evolução da procura tem encontrado resposta na oferta, já que se assistiu (e se assiste) a um continuado aumento da produção destes frutos, a nível nacional e a nível global. Quando produzido fora de época, a cultura do mirtilo é particularmente valorizada e, consequentemente, geradora de um mais elevado valor acrescentado (Williamson e Lyrene, 2004).

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Pelas características fortemente sazonais da produção na Europa surge em Portugal, e em especial no sudoeste do país, a oportunidade de reduzir o período não-produtivo produzindo-se mirtilo durante a primavera e, também, em setembro, possibilitando o aproveitamento de uma janela de oportunidade correspondente à prática de preços elevados na Europa nestes períodos. Por outro lado sabe-se que o preço do mirtilo, em fresco, começa a decrescer em julho com a entrada no mercado de fruta proveniente do mercado Francês, Polaco (Pliszka, 1997) e Alemão (Ciordia et al., 2002). Este facto reforça a ideia de que, antecipar e atrasar a colheita é conveniente para maximizar o resultado económico das explorações, o que, é premissa necessária aos produtores portugueses, segundo Batista et al. (2006), apesar das boas condições climáticas do Sul da Europa para a produção ao ar livre e sob proteção de mirtilos do tipo “Southern Highbush” (Barrau et al., 2003; Lopes-da-Fonseca e Oliveira, 2001).

Na medida em que a produção do mirtilo está condicionada à ocorrência de frio, há que ter em conta as horas de frio necessárias para cada cultivar. Como é sabido, as plantas perenes têm a capacidade de entrar num estado de dormência e desenvolver uma resistência ao frio (Powell, 1987). Assim que as plantas entram naquele estádio (Lang et al., 1987), é necessário um período de frio para o abrolhamento vegetativo e floral na primavera seguinte. As necessidades de frio previnem assim que ocorram crescimentos durante período de temperaturas amenas durante o inverno e ajuda a sincronização entre o crescimento das plantas e as condições ambientais favoráveis para que este aconteça (Rowland et al. 1999).

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Foi a partir do conhecimento descrito que, na procura da otimização da produção fora de época, se efetuaram dois ensaios na Herdade Experimental da Fataca, concelho de Odemira. Em ambos os ensaios foram utilizadas cultivares “Southern Highbush” (SHB) e “Northern Highbush” (NHB), nomeadamente: ‘Paloma’, ‘Star’ e ‘O’Neal’ (SHB), e ‘Legacy’, ‘Elizabeth’ e ‘Duke’ (NHB). As plantas foram colocadas em câmara frigorífica para que completassem o número de horas de frio necessário e/ou alterar o ciclo produtivo, com posterior colocação em estufa (Figura 2). 

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No primeiro ensaio, com o objetivo de antecipar a produção de mirtilo para a primavera, as três cultivares de SHB foram colocadas em câmara frigorífica (0 / +2ºC) a 10 de dezembro de 2012 e 10 de janeiro de 2013, e retiradas a 9 de janeiro de 2013 e 30 de janeiro de 2013, o que perfaz um total de 696 horas para a primeira data de entrada em câmara e 480 horas para a segunda data, a que acrescem as horas de frio natural (Figura 3). A ‘Star’ foi a cultivar mais produtiva ao ar-livre e a que os tratamentos de frio não tiveram qualquer efeito significativo na produção e no calibre. A cultivar O’Neal foi a que mostrou responder melhor aos tratamentos de frio. No entanto, a sua produção não foi significativamente diferente para todos os tratamentos nem da ‘Star’ em qualquer tratamento de frio (Tabela 1).

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Os tratamentos de frio não influenciaram a produtividade da ‘Paloma’ mas esta cultivar beneficiou significativamente do ambiente protegido da estufa, sem alterações no calibre dos frutos. As plantas da primeira e segunda entradas em câmara apresentaram diferenças significativas no calibre.

O segundo ensaio tinha como objetivo principal estudar o efeito da permanência em câmara no ciclo produtivo do mirtilo, tendo em vista atrasar a entrada em produção para que a colheita fosse realizada durante o mês de setembro. Para tal, recorreu-se às cultivares NHB, com maiores necessidades de horas de frio, testando-se simultaneamente as cultivares SHB. Neste ensaio, os tratamentos de frio consistiram na entrada de todas as plantas numa só data, 14 de janeiro de 2013, na câmara frigorífica e a saída em quatro datas sucessivas desfasadas de 15 dias; 15 de maio, 1 de junho, 15 de junho e 30 de junho de 2013. Foram assim acumuladas 2904 h, 3288 h, 3648 h e 4008 h de frio, respetivamente.

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As três cultivares SHB apresentaram uma produção insignificante (dados não apresentados), não suportando tratamentos de frio tão prolongados. Assim, o excesso de frio nas cultivares SHB revelou ser prejudicial ao desenvolvimento de gomos florais, potenciando e favorecendo os crescimentos vegetativos (Figura 4). Não foi também considerada a quarta e última saída da câmara frigorífica (frio natural + 4008 h de frio) por a produção ter sido igualmente insignificante nas cultivares NHB.

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O tratamento de frio com menor número de horas de frio (15 maio) foi o que apresentou as maiores produções, em particular na cultivar ‘Duke’ em que a produção foi significativamente superior a todos os outros tratamentos.

A ‘Elizabeth’ foi a cultivar em que não houve qualquer tipo de resposta aos diversos tratamentos visto que a sua produção nunca diferiu significativamente, já a ‘Legacy’ revelou ser sensível ao excesso de frio pois a produção, nas duas últimas datas de saída da câmara (1 e 15 de junho) foi significativamente mais baixa quando comparada com os outros tratamentos. Os resultados indicam que esta cultivar apresenta um comportamento mais aproximada das cultivares do tipo SHB que NHB (Figura 5).

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O calibre, em todos os tratamentos do ensaio, variou entre 0,84 e 1,36 g/fruto sem diferenças significativas entre cultivares e tratamentos.

Os resultados obtidos com os dois ensaios efetuados revelaram ser bastante positivos no desenvolvimento de novas tecnologias de produção de mirtilo fora de época, quer para a produção precoce com tardia. A boa resposta da ‘Paloma’ em cultura protegida sugere que esta cultivar deve ser testada de novo com entrada em câmara antes de outubro (após diferenciação floral) para forçagem em novembro. Novas cultivares do tipo NHB devem ser testadas uma vez que se verificou uma entrada em produção muito rápida com antecipação em relação ao período de produção esperado. Cultivares tardias como a Aurora e a Elliott são boas candidatas para a produção tardia.

Bibliografia

–    Barrau, C., Santos, B., Calvo, D., Medina, J.J., Molina, J.M. e Romero, F., 2003. Low chilling blueberries (Vaccinium spp.) studies in Huelva (Andalusia, SW Spain): present and future. Ata Horticulturae 649:305-308.
–    Batista, M.C., Oliveira, P.B., Lopes-da-Fonseca, L. e Oliveira, C.M., 2006. Early ripening of southern highbush blueberries under mild winter conditions. Ata Horticulturae 715:101-106.
–    Ciordia, M., Díaz, M.B. e García, J.C., 2002. Blueberry culture both in pots and under Italian-Type tunnels. Ata Horticulturae 574:123-127.
–    Lopes-da-Fonseca, L. e Oliveira, P.B., 2001. A produção de mirtilos em Portugal. Atas do I Colóquio Nacional da Produção de Morangos e Outros Pequenos Frutos. 163-164.
–    Pliszka, K. (1997). Overview in Vaccinium production in Europe. Ata Horticulturae 446:49-52.
–    Williamson, J.G. e Lyrene, P.M., 2004. The Florida blueberry industry: A decade of growth. Proc. Fla. State Hort. Soc. 117:234-235.

Este trabalho é um resumo da Dissertação a submeter ao Instituto Superior de Agronomia, Universidade de Lisboa, para a obtenção do grau de Mestre em Engenharia Agronómica – Hortofruticultura e Viticultura e teve suporte financeiro do projeto europeu FP7 EUBerry (Grant agreement Nº 265942).

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