Phthorimaea operculella: A traça da Batata

Phthorimaea operculella: A traça da Batata

Por: Emanuel Moreda, Estudante da Escola Superior Agrária de Ponte de Lima

A batata (Solanum tuberosum L.) é, a nível mundial, um dos vegetais mais produzidos, sendo, por isso, também dos mais presentes na alimentação humana. Segundo dados da FAO (Food and Agriculture Organization of the United Nations) (2011) [2], a China apresenta-se como o maior produtor mundial deste tubérculo, seguindo-se a India e a Rússia. Portugal ocupa o 73º lugar na lista dos produtores mundiais, assumindo a 25ª posição a nível europeu.

Assumindo-se como uma cultura de larga expressão, a batata, como a maioria dos vegetais que exibem intensivos níveis de produção, depara-se com inimigos naturais e outros problemas fitossanitários que carecem de uma atenta monitorização por parte do produtor, no sentido de minimizar efeitos negativos sobre a cultura, maximizando, desta forma, os níveis de produção.

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De entre os principais problemas que afetam a cultura de S. tuberosum, tais como o escaravelho da batateira e doenças como a alternariose ou o míldio, destaca-se a traça da batata (Phthorimaea operculella (Zeller, 1873)). Hoje disseminada pela maioria dos países produtores de tubérculo (figura 1) [10], P. operculella surge pela primeira vez a sul do continente Americano, sendo apenas na década de 70 reconhecida como praga [9].

Atualmente P. operculella, apresenta-se como a praga que mais estragos/prejuízos provoca na batata, tanto durante o ciclo cultural, como durante o seu processo de armazenamento, originando perdas superiores a 70% [1]. P. operculella é um lepidóptero da família Gelechiidae. Trata-se de um inseto oligófago, ou seja, subsiste servindo-se de espécies vegetais pertencentes a um mesmo género ou família, neste caso, das Solanáceas [6]. De salientar que, como todos os lepidópteros, estas borboletas passam por quatro estádios de desenvolvimento: adulto, ovo, larva e pupa (Figura 2).

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Os adultos são pequenas borboletas (figura 3), cujo comprimento é aproximadamente de 10 a 12 mm [1] e com uma envergadura de cerca de 1,27cm [10], sendo que existe uma pequena diferença entre indivíduos macho e fêmea, apresentando-se os primeiros com dimensões ligeiramente inferiores aos segundos [11]. Característica intrínseca aos adultos são as grandes antenas e uma coloração geral acinzentada. São ainda constituídos por dois pares de asas: posteriores e anteriores. As asas posteriores apresentam coloração cinzenta e possuem sedas compridas; as anteriores, por sua vez, apresentam uma coloração cinzenta/amarelada com pequenas e irregulares manchas negras [1]. De salientar é o facto de os adultos exibirem hábitos crepusculares a nocturnos, refugiando-se em folhas, sob torrões ou variados restos vegetais, durante o dia [4]. E a fase da cópula ocorrer entre 16 a 20 horas após a emergência dos adultos, fase esta que perdura por cerca de 85 a 200 minutos [10].

Os ovos, maioritariamente postos em período noturno, podem ser colocados tanto na folhagem, como no solo ou em restos vegetais, ou ainda em tubérculos expostos. Caracterizam-se, além do mais, pelas dimensões = 0,1cm, formato esférico, aspeto translúcido e coloração que varia entre branco ou amarelado a castanho claro. Cada fêmea poderá pôr de 38 a 290 ovos, de forma isolada, com um período de incubação que varia entre os 5 e os 34 dias, número de dias que dependerá da temperatura circundante, apresentando uma viabilidade final de cerca de 47% [1; 10].

Dos ovos eclodem larvas (Figura 4), as quais atravessam quatro instares antes da fase  pupal. Ao longo dos referidos instares, as larvas exibem um desenvolvimento morfológico notório, expressando características, tais como a evolução da coloração corporal de castanho claro a verde ou rosa, sendo a cápsula cefálica de coloração castanha escura, a diferenciação sexual e ainda o seu comprimento que geralmente atinge os 10 e 12 mm [5; 10]. Importante será mencionar que é nesta fase que P. opeculella mais estragos provoca. As lagartas instalam-se nas folhas, caules, ou tubérculos por períodos compreendidos entre 11 a 40 dias [7]. Nas folhas, as lagartas alimentam-se do parênquima, perfurando galerias no limbo foliar, contribuindo negativamente para a realização da fotossíntese; ao nível do caule perfuram desde axilas foliares a meristemas apicais; nos tubérculos, por sua vez, o ataque resulta em abertura de galerias, nas quais se observam detritos e, além disso, constituem uma porta aberta ao desenvolvimento de fungos e/ou bactérias, que também influenciam na depreciação das batatas [4; 5].

Findo o desenvolvimento larval, esta deixa o tubérculo ou a parte aérea da planta, instalando-se, posteriormente, no solo, folhas secas, resíduos vegetais, caixas, ou em paredes e pisos de armazéns, com a finalidade de se transformar em pupa. As pupas exibem comprimentos de cerca de 8mm, coloração castanha clara e aspecto/textura lisa [5; 10]. O estádio pupal não possui uma duração definida, estando esta dependente de condições climatéricas, nomeadamente ao nível das temperaturas, no entanto poder-se-á assumir de 10 a 30 dias como um intervalo médio, ao fim do qual os adultos eclodem, iniciando assim uma nova geração desta praga [10].

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Considerando o período de tempo necessário ao completo desenvolvimento de cada estádio, bem como a sua relação com os factores abióticos, P. operculella pode dar origem a várias gerações por ano. Em zonas mediterrânicas a traça da batata pode atingir entre 6 a 7 gerações por ano. Em Portugal, porém, o número de gerações não excede as 3 anuais [1].

Como referido anteriormente, esta praga representa uma ameaça aquando do ciclo cultural, bem como do posterior armazenamento das batatas Temperaturas em torno dos 25ºC, nunca a baixo dos 10ºC, associadas a um clima geralmente seco, constituem o melhor ambiente para o desenvolvimento de P.operculella. O inverno é passado no estado de hibernação, sob o estado de pupa, quando a praga se encontra no campo, ou sob qualquer outra fase de desenvolvimento quando se encontra em armazém, local onde a praga se pode multiplicar mesmo durante esta estação, visto os refúgios conservarem condições favoráveis. De referir que, em Portugal, as pupas enterradas no solo, emergem como adultos nos meses de março ou abril [1].

Representando os estragos de P. operculella, prejuízos irremediáveis no sucesso do cultivo da batata, todas as práticas culturais e os meios de luta que propiciem a redução da actividade ou o extermínio desta praga, são de uma enorme valência. Hoje existem variadas formas de luta que ajudam a prevenir, monitorizar e combater a traça da batata, sendo que o sucesso das mesmas dependerá, como em qualquer luta a uma praga, de um atempado e rigoroso planeamento das acções a tomar.

Assim, a avaliação da população da praga no campo é ponto fulcral para o melhor posicionamento de tratamentos a aplicar. Esta avaliação é realizada recorrendo a armadilhas sexuais do tipo “delta”, as quais são impregnadas com uma feromona que atrai e captura as borboletas macho [3; 10].

A presença de P. operculella na cultura também poderá ser limitada, jogando com alguns dos aspetos da sua ecologia. Uma vez que a praga prefere os tubérculos, a escolha por variedades de ciclo mais curto e/ou de tuberização mais profunda, afigurar-se-á mais vantajosa. No que respeita às técnicas de plantio, quer seja rasa ou se realize amontoa, dever-se-á ter em atenção a profundidade de cultivo, por forma a evitar a possível exposição dos tubérculos [3; 10]. A rega é outro aspeto cultural que, devido ao humedecimento do solo, permite a agregação do mesmo, dificulta o movimento da praga, inviabiliza as posturas e permite ainda uma ligeira diminuição da temperatura [3]. A antecipação da colheita é ainda uma prática cultural que poderá prevenir maiores danos ao nível do tubérculo, podendo-se esta executar através do corte ou aplicação de herbicidas de contacto específicos na rama da batateira, que permitirá acelerar o processo de maturação da batata.

Para além das técnicas culturais que possibilitam um controlo da população da traça da batata existem, ainda, disponíveis no mercado alguns produtos químicos e biológicos que protegem tanto a planta, como o tubérculo, quer em campo, quer durante o armazenamento. Os produtos biológicos existentes no mercado, embora não específicos para a traça da batata, são os aconselhados para combater a praga, visto o seu espectro de ação ser indicado a lepidópteros, dando-se como exemplo os inseticidas DIPEL WP e BELTHIRUL [1]. Os produtos em questão possuem como principal constituinte o Bacillus thurigiensis, bactéria que sintetiza toxinas que causam a lise do intestino médio de lepidópteros, sendo que a sua aplicação é realizada através de pulverizações no campo, a partir do momento em que se verifique o ataque da praga [8]. No que respeita a produtos de origem química, existem inseticidas pulverizáveis no campo, com a especificidade de, entre outros, o combate à traça da batata. O mercado disponibiliza algumas soluções, como é o caso dos inseticidas BULLDOCK, à base de beta-ciflutrina, ou CIFLUMAX, à base de ciflutrina, ambos inseticidas de ação por contacto e ingestão, que atuam ao nível do sistema nervoso de P. operculella [1]. Já no armazenamento, é prática comum polvilhar as batatas, antes do abrolhamento, com um insecticida à base de deltametrina. No mercado existem à disposição inseticidas piretróides, como é o exemplo o JACKPOT ou PODRINA, que atua tanto por contacto como por ingestão, bloqueando a transmissão dos impulsos nervosos dos insetos. A aplicação do pó inseticida deve ser executada utilizando, preferencialmente, um polvilhador de fole, por forma a que, no armazém, cada camada de batata depositada esteja homogeneamente polvilhada. Salvaguarda-se, ainda, a restrição a apenas uma aplicação por campanha [1; 3].

Visto esta praga possuir uma significativa reprodução no armazenamento, é fundamental selecionar, prévia e tão célere quanto possível for, os tubérculos, evitando que batatas infestadas persistam no local, constituindo uma fonte de contaminação. O armazém, além disso, deverá ser devidamente desinfetado antes de receber a nova produção, ser escuro, fresco e arejado por forma a evitar ser um local propício ao desenvolvimento de P. operculella.

A exigência dos mercados mundiais cresce a cada dia que passa, obrigando os produtores agrícolas a evoluir/aprimorar as técnicas que desenvolvem no exercício das suas actividades. A traça da batata é um percursor de avultadas perdas/desperdícios, sendo que o planificado e eficiente emprego de práticas adequadas poderá representar o sucesso no controlo da praga.

Bibliografia

[1] DRAP Centro, 2012. Traça da Batata (Phthorimaea operculella Zeller) – Ficha Técnica nº. 1. Site disponível: Fitorrega, URL: fitorrega.net/wp-content/uploads/group.../1349254428-Traadabatata.pdf. Consultado em 28 Jul 2013.
[2] Food and Agriculture Organization of the United Nations, 2011. Site Disponível: FAOSTAT, URL: http://faostat.fao.org/. Consultado em 29 Jun 2013.
[3] Infoselectis, 2012. Revista Infoselectis – nº19: Dossier Técnico – Traça da Batata. Site Diposnível: Selectis, URL: www.selectis.pt/InfoselectisNº19.pdf. Consultado em 1 Jul 2013.
[4] Mallmann, N.; Resende, J. T. V.; Faria, M. V.; Salavador, E. D.; Resende, F. V.; Faria, C. M. D. R.; s/d. Avaliação da Eficiência de Inseticidas no Controle de Phthorimaea Operculella na Cultura de Batata. Site Disponível: Associação Brasileira de Horticultura, URL: www.abhorticultura.com.br/biblioteca/arquivos/Download/.../44_336.pdf. Consultado em 1 Jul 2013.
[5] Mascarin, G. M.; 2009. Controle microbiano da traça da batata, Phthorimaea operculella (Zeller, 1873) (Lepidoptera: Gelechiidae), com granulovírus. Dissertação de Mestrado em Ciências, Área de Entomologia, Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, Universidade de São Paulo, Piracicaba, 119 pp.
[6] Monteiro, R. F.; Macedo, M. V.; Nascimento, M. S.; Cury, R. S. F.; 2007. Composição, abundancia e notas sobre a ecologia de espécies de larvas de lepidópteros associadas a cinco espécies de plantas hospedeiras no Parque Nacional da Restinga de Jurubatiba, RJ. Revista Brasileira de Entomologia, nº.4, vol. 51, 476-483.
[7] Palacios, M.; 1997. Principales Plagas de la Papa: La Polilla de la Papa y La Mosca Minadora. In Produccion de Tuberculos-Semillas de Papa. O Hidalgo (Ed). Centro Internacional de la Papa (CIP), Manual de Capacitacuón. Lima – Perú. Fascículo 3.7-97.
[8] Pinto, L. M. N.; Berlitz, D. L.; Castilhos-Fortes, R.; Fiuza, L. M.; 2010. Toxinas de Bacillus thuringiensis. Biotecnologia e Desenvolvimento, nº. 38, 24-31.
[9] Rivera, M. J.; 2011. The Potato Tuberworm, Phthorimaea operculella (Zeller), in the Tobacco, Nicotiana tabacum L., Agroecosystem: Seasonal Biology and Larval Behavior. Tese de Mestrado em Ciências, Departamento de Entomologia, Faculty of North Carolina State University, North Carolina, 93 pp.
[10] Rondon, S. I.; 2010. The Tuberworm: A Literature Review of Its Biology, Ecology, and Control. American Journal of Potato Research, nº. 2, vol 87, 149-166.
[11] SARH, 1990. Manejo Integrado de la palomilla de la papa Phthorimaea operculella (Zeller) (lepidóptera: Gelechiidae) en el Bajio, Mexico. Publicação especial Número 23, 2ª Edição, 55 pp.

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