Opinião: O futuro da PAC

Opinião de Francisco Guerreiro

Vice-presidente da Comissão da Agricultura e do Desenvolvimento Rural e membro do Grupo Parlamentar Verdes/Aliança Livre Europeia

Francisco Guerreiro

A 22 de outubro, o Parlamento Europeu emitiu a sua posição sobre a Política Agrícola Comum (PAC) – um fundo europeu de 350 mil milhões de euros. O próximo passo em curso são as negociações (trílogos) entre as três principais instituições Europeias – Comissão Europeia (CE), Parlamento Europeu e Conselho da União Europeia –, que objetivam chegar a um acordo sobre como os fundos agrícolas para o período de 2021 a 2027 devem ser atribuídos.

Os resultados da votação da PAC são decepcionantes para mim, bem como para o grupo que integro, os Verdes/Aliança Livre Europeia. A situação levou, também, a que os grupos que tendencialmente adotam posições mais conservadoras se mostrassem divididos na hora da votação.

A mim interessa-me que a PAC não continue a financiar a degradação da biodiversidade, da saúde humana e do respeito pela vida animal, como tem feito desde a sua criação, em 1962. O texto final falha em reverter este paradigma, significando que a agricultura, como a conhecíamos e conhecemos, extinguir-se-á porque os agricultores terão que adaptar-se radicalmente às mudanças climáticas, infertilidade irreversível dos solos e extinção de espécies. Por detrás dos subsídios da PAC, temos um sistema que se tornou injusto, seguindo o crescimento do mercado e globalização.

Começou por ser um sistema de apoio a pequenos agricultores, que vendiam sobretudo localmente, e passou a ser um sistema que apoia principalmente os grandes senhorios e produtores.

A organização COPA-COCEGA, que investe fortemente em fazer lobbing com os decisores políticos, diz representar os interesses dos agricultores europeus, mas as suas posições favorecem claramente a indústria agrícola intensiva e atulhada de fertilizantes químicos.

Juntamente com os Estados-membros, a COPA-COCEGA pressiona para que 80% do dinheiro público da PAC continue a ser direcionado para apenas 20% dos recipientes, ou seja, os grandes senhorios e oligarcas com fortes relações com aqueles no poder. Como a voz destes últimos mais facilmente ecoa nos Parlamentos nacionais e no Europeu, foram, novamente, as suas irracionalidades priorizadas para a PAC 2021-2027.

A própria CE critica o Parlamento e o Conselho por apoiarem uma redução dos requisitos ambientais mínimos para atribuição de fundos, o que coloca em risco a capacidade da CAP se alinhar com os objetivos de combate às mudanças climáticas, como o objetivo de investir no clima pelo menos 30% do total dos fundos europeus para 2021-2027.

A recente estratégia Europeia ‘Do Prado ao Prato’, que objetiva tornar sustentável a forma como produzimos, distribuímos e consumimos os alimentos, reconhece que 10,3% das emissões europeias de gases com efeito de estufa provêm da agricultura, e, destas, 70% advêm da produção pecuária. No entanto, as visões do Parlamento ou Conselho para a PAC em nada contribuem para que haja uma redução da produção intensiva ou consumo de animais.

No geral, a UE necessita que esta PAC acabe com os subsídios atribuídos por hectare detido; favoreça os pequenos agricultores e, ainda mais, os que se dedicam à produção orgânica. Relativamente ao consumo excessivo de carne e lacticínios, é necessário eliminar os subsídios à produção intensiva de animais; acabar com os subsídios para marketing destes produtos e atribuir incentivos aos agricultores que desejam abandonar a produção de animais para produzirem proteínas vegetais. O bem-estar animal preocupa os consumidores e influencia as suas escolhas.

É o dever da UE incentivar os agricultores a elevarem os seus padrões de bem-estar animal; acabar com as gaiolas e desenvolver uma etiqueta para os rótulos dos produtos de origem animal que indique o tipo de sistema de criação e abate, incentivando os consumidores a fazerem melhores escolhas.

Os trílogos ainda decorrem e os cidadãos aguardam ansiosamente para que os decisores políticos da UE ponham de parte os interesses económicos e lutem para reverter o problema ambiental que enfrentamos. Haja vontade e coragem política.

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