Opinião: Antes de comer, falemos de biossegurança

Opinião de Miguel Alves

Miguel Alves é CEO da Zoono Ibéria

Miguel Alves

Nos últimos meses temos testemunhado o impacto devastador que surtos de doenças podem ter sobre a saúde e a economia. Sendo certo que uma solução para a pandemia pode ainda demorar a ficar disponível, é encorajador saber quantos organismos e comunidades, à escala global, estão a investigar o problema e a trabalhar sobre medidas preventivas a aplicar no futuro. Ainda assim, no próximo inverno, a segunda onda do coronavírus responsável pela Covid-19 não é a única grande ameaça biológica que espreita no horizonte.

Estima-se que 60% das doenças dos seres humanos derivam de problemas zoonóticos. Significa isto que mais de metade das situações em que um vírus ou bactéria afeta uma pessoa tem origem nos animais consumidos como alimento e, por inerência, às condições de bem-estar (ou falta dele) a que estiveram expostos.

Mais do que conformar as regras que previnem a exposição a riscos biológicos e as medidas para a sua contenção e eliminação, a biossegurança garante a proteção da saúde pública, através do controlo de cargas microbianas, ao longo do ciclo de produção, nos espaços de exploração. Como? Através de uma desinfeção adequada a cada sistema, seja ele de avicultura, suinicultura, exploração de bovinos ou outro.

Alimentos e animais criados em condições de risco despoletam um ciclo de resposta que em nada beneficia o produto final - ou o consumidor. Já se provou, por exemplo, que em ambientes de produção animal com carga microbiana reduzida se podem conseguir ciclos sem administração de antibióticos aos animais, com um crescimento mais rápido dos mesmos e um menor consumo de ração, uma vez que não gastam energia adicional para debelar infeções. E não esqueçamos também a água e a ração com que os animais são alimentados, e que requerem ações específicas para salvaguarda da segurança alimentar.

É fácil compreender que o crescimento populacional e a pressão gerada por um consumo crescente de produtos de natureza animal levou a um aumento da necessidade de produção. Mas a acompanhar esta tendência surgiram também questões que nos devem fazer pensar: como acomodar mais animais de forma segura? Quais as medidas de segurança necessárias para evitar contaminações em pavilhões cada vez maiores? Como assegurar que os produtos não prejudicam a saúde pública? Qual o caminho para se garantir uma cadeia de produção e consumo mais saudável?

Quando se diz que somos o que comemos, quer-se dizer que a carne, os ovos, o leite e seus derivados que resultam da responsabilidade sobre a saúde e bem-estar dos animais tem na sua base uma ação chave: a desinfeção. Para além de desinfeções condizentes com os ciclos de criação, diferentes para cada espécie animal, os princípios da biossegurança também preveem o cumprimento de regras de higiene e segurança por quem trabalha nas explorações, aos responsáveis pelo abate e processamento, assim como aos transportadores e comerciantes. Já do lado do consumidor final, a necessidade de escolhas conscientes e de um acondicionamento e confeção corretos também não pode ser ignorada.

A ameaça de surtos de gripe aviária, de peste suína africana ou de infeções por Salmonella são uma preocupação constante para os criadores e para as autoridades, uma vez que a circulação rápida de agentes patogénicos e a proliferação de super-bactérias termina, na maior parte dos casos, na morte de humanos e na eliminação de grandes lotes de animais.

Mudanças climáticas, intensificação agrícola, mobilidade humana global, resistência pública a pesticidas e vacinas - os desafios para a biossegurança são muitos e complexos. Mas se, tal como estamos a fazer para combater a pandemia, começarmos a assumir a desinfeção como a melhor aliada da biossegurança, estaremos a garantir bem mais do que a nossa próxima refeição.

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