Medronho, um “tesouro” a descobrir

As Jornadas do Medronho juntaram cerca de 160 participantes, no dia 12 de outubro de 2012, na Escola Superior Agrária de Coimbra. Toda a cadeia de valor do medronho foi apresentada, desde a semente à aguardente e concluiu-se que tem grande potencial

Tradicionalmente quando se fala em medronho, pensa-se em aguardente. As Jornadas do Medronho pretenderam desmitificar esta ideia, no passado dia 12 de outubro, apresentando um conjunto de diferentes utilizações e vantagens desta produção. Perante uma plateia que juntou diferentes membros da cadeia de valor do medronheiro desde produtores, municípios, confrarias, investigadores e professores universitários, a presidente da Associação Portuguesa de Horticultura, Elvira Ferreira, defendeu que o medronho “é um verdadeiro tesouro”. De acordo com o engenheiro João Gama, da Direção Regional de Agricultura e Pescas do Centro, a plantação de medronho tem várias potencialidades. Para além da sua utilização para a produção de aguardente, o fruto pode ser consumido fresco, utilizado para compotas, produtos de pastelaria, gelados, entre outras. Para João Gama, o medronheiro é ainda um arbusto a ter em conta no contexto de uma silvicultura preventiva, visto que se trata de uma espécie com uma inflamabilidade média e a sua retoma de produtividade após incêndios é de apenas 3 anos.

O consumo do fruto fresco

Adriana Guerreiro, engenheira e doutoranda da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade do Algarve, tem centrado os seus estudos no consumo do medronho e na sua conservação. Segundo Adriana Guerreiro, apesar do excelente sabor, os frutos do medronho são pouco consumidos em fresco. Uma das razões prende-se com a sua fragilidade, pelo que a comercialização requer cuidados especiais.

Para o estudo, os frutos foram colhidos na serra do Caldeirão, no Algarve, e depois de selecionados foram armazenados em cuvetes de polistereno expandido. Cada cuvete continha 15 frutos. Estes foram depois armazenados em câmaras de refrigeração a 0, 3 e 6 graus. O estudo concluiu que o medronho é um fruto com potencial por ser fonte de antioxidantes, apresentando resultados superiores à framboesa e ao morango. Apresenta também uma razoável quantidade de vitaminas e carotenoides. Além disso, verificou- se que o medronho contém baixa quantidade de etanol, “o que vem contrariar o senso comum, de que estes causam embriaguez”, explicou Adriana. Quanto à sua conservação, concluiu-se que o fruto se pode conservar pelo menos cerca de 15 dias a temperaturas entre os 0 e 3 graus, mantendo a aparência e propriedades inalteradas. Estas conclusões demonstram “o subaproveitamento do medronho, que pode ser um complemento à produção de aguardente”. Para lá de investigadora, Adriana Guerreiro está a apostar na produção do medronho para consumo. Mas sozinha não consegue. “Não tenho meios nem capacidade para tal”, desabafa. “É preciso que haja mais alguém como eu, que veja potencial no fruto”.

A produção de aguardente: O exemplo da Silvapa

Em Portugal, a Silvapa, é a única empresa legalmente autorizada a produzir aguardente engarrafada. A empresa dedica-se à sua produção desde 1995. Em 2004, começou a produzir a bebida em destilaria própria e segundo o processo artesanal, utilizando um alambique de cobre com aquecimento elétrico. Para Margarida Silva, o objetivo da empresa é disponibilizar ao consumidor “um produto de qualidade que respeite o processo de fabrico artesanal, e que valorize o medronho”, enquanto recurso natural da região do Pinhal Interior Sul. Além da aposta no mercado nacional, em lojas de produtos tradicionais e gourmet ou na restauração, a empresa tem exportado para a Europa, sobretudo, para a Suíça e Alemanha. Na exportação, o principal problema prende-se com a falta de escala na produção. Margarida Silva conta que já receberam pedidos do Brasil e da Austrália a que não conseguiram dar reposta. Foi mais longe e defendeu que seria “bom” surgirem novas empresas de produção de aguardente que trabalhassem em conjunto.

Novos produtores de medronho

Durante as jornadas, a Pequenos Frutos encontrou dois produtores de medronho dispostos a apostar no fabrico de aguardente. Jorge Simões têm a sua plantação, com cerca de 15 hectares, no Estreito, concelho de Oleiros. “Toda a gente anda à procura de ouro e ele está mesmo ao pé da porta”, defendeu o produtor, salientando, que se deve valorizar e explorar as potencialidades de cada região. Jorge Simões iniciou a plantação do medronheiro há cerca de 7 anos e, até ao momento, já investiu perto de 70 mil euros. Com o medronho vindo da plantação, começou a fazer algumas experiências na produção de aguardente que enviou para análise. “ A ideia era ver o que estava bem e o que poderia ser corrigido”, para apostar na produção de uma aguardente de qualidade e que responda também às necessidades do mercado. “Se trabalharmos só para o país estamos a ter uma visão curta”, concluiu. A mesma opinião tem José Martins.

Começou a dedicar-se ao medronheiro há cerca de 6 anos, na sua plantação na Pampilhosa da Serra, com 26 hectares. O seu objetivo é criar uma marca própria e exportar toda a produção. “ Lá fora chegam a pagar 25 euros por litro, que é muito bom”. Para já o investimento rondou os 3 mil a 4 mil euros por hectare, o que totaliza cerca de 100 mil euros. E a aposta no medronheiro vai continuar. Candidatou-se ao programa PRODER, na qualidade de jovem agricultor, de forma a conseguir financiamento para a plantação de mais 20 hectares. José Martins deixa ainda algumas dicas para futuros produtores: “ É necessário ter muita atenção ao solo pois é fundamental para o desenvolvimento da planta e o sistema de rega também deve ser escolhido com cautela”, esclareceu.

O mel de medronheiro

O mel de medronheiro é outra das possibilidades de utilização do medronho. Na sua apresentação, Luís Filipe Estevão, presidente da PAMPIMEL (Cooperativa de Apicultores e produtores de medronho da Pampilhosa da Serra) deu a conhecer as potencialidades deste produto. As principais características diferenciadoras do mel de medronho são o seu sabor amargo e ácido, a sua cor escura e o alto teor antioxidante. Graças ao seu sabor, este mel é cada vez mais apreciado em Portugal, por exemplo, para a elaboração molhos. Mas é no mercado externo, sobretudo, nos países do norte da Europa e na região da Sardenha que é mais valorizado. Nestes mercados, o preço atinge os 20 euros por quilograma, enquanto em Portugal se situa nos 7 euros. No entender de Luís Estevão, esta “é uma forte razão” para a aposta na produção. No futuro, acredita que cerca de 80 por cento da produção nacional terá como destino a exportação. Quanto às dificuldades, estas estão relacionadas com os baixos níveis de produção, com a elevada humidade e fraca maturação do mel na colmeia (as abelhas polinizam o medronheiro no inverno, quando os dias são mais curtos e o sol pouco quente). E ainda com a inexistência de marketing e de canais de comercialização. Para dar resposta a estas questões foi criada, no ano passado a PAMPIMEL.

Jornadas superam expectativas

Para a organização, nas palavras Filomena Gomes, professora da Escola Superior Agrária de Coimbra, as jornadas do medronho “excederam as expectativas”, não só pelos números de participantes como também pelas comunicações apresentadas, que evidenciaram a obrigatoriedade da valorização do setor. No seu entender, “é necessário dar continuidade aos trabalhos”, entre produtores e investigadores para a elaboração do manual de boas práticas da cultura do medronho e do manual de boas práticas para a produção de aguardente, este último já em fase final de apresentação. Filomena Gomes defendeu ainda que “é premente” a organização dos produtores de medronho de forma a otimizar o setor.

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