Fibra Dietética de Cogumelo como Ingrediente Alimentar

Fibra Dietética de Cogumelo como Ingrediente Alimentar

Por: Sara Fraga

A produção de cogumelos está a atravessar neste momento uma fase bastante positiva e como tal, o seu estudo aprofundado tem ganho bastante destaque por parte da comunidade científica.

Em estudos realizados anteriormente verificou-se o potencial das fibras extraídas a partir de cogumelos e resíduos de cogumelos para incorporação em alimentos com o intuito de os enriquecer nutricional e funcionalmente.

A composição química dos cogumelos é variável entre espécies e dentro da mesma espécie, sendo dependente de vários fatores como a maturidade, humidade relativa e temperatura durante o cultivo e condições de pós-colheita. O seu componente maioritário é a água, contabilizando entre 82 a 95% do peso fresco dos cogumelos. O teor de proteína varia entre 11 a 35% e o teor de cinzas entre 6 a 13%. O teor de gordura é variável estando compreendido entre 2 a 9% e os hidratos de carbono são os principais constituintes da matéria seca dos cogumelos podendo estar presentes principalmente como polissacarídeos mas também como glicoproteínas (Synytsya et al., 2008). Dentro dos hidratos de carbono, a fibra dietética é o principal componente dos cogumelos, tornando-os uma fonte rica em fibra dietética.

Em estudos realizados anteriormente verificou-se o potencial das fibras extraídas a partir de cogumelos e resíduos de cogumelos para incorporação em alimentos com o intuito de os enriquecer nutricional e funcionalmente.

Uma grande diferença estrutural entre as plantas e os fungos é o facto de as células dos fungos terem paredes celulares que contêm quitina, ao contrário das células vegetais, que contêm celulose. A parede celular dos fungos é uma estrutura bastante dinâmica, com características únicas que são fundamentais em inúmeros processos essenciais à célula (Bowman et al., 2006). A parede celular determina o formato da célula, fornece suporte osmótico, proteção física e está relacionada com situações de sinalização celular, adesão e reprodução (Nimrichter et al., 2005; Perez et al., 2004; Fukuda et al., 2009). As glucanas representam 50-60% do peso seco dos fungos e têm uma importante função estrutural na parede celular (Bowman et al., 2006) principalmente as ß-glucanas (1?3), (1?6) e as a-glucanas (1?3). Estes polissacarídeos podem ser lineares ou ramificados e podem estar livres ou associados a proteínas, lípidos e outros polissacarídeos.

As ß-glucanas da parede celular encontram-se extensamente ligadas à quitina e proteínas criando um complexo que constitui a base da parede celular.

Estes polissacarídeos apresentam todas as características nutricionais de uma fibra dietética, isto é, não são digeríveis pelas enzimas humanas presentes no trato gastrointestinal superior (Mantovani et al., 2008; Cheung, 2008). Os polissacarídeos de grande peso molecular presentes nos cogumelos como as glucanas ß(1?3) e ß(1?6) têm fortes efeitos sobre o sistema imunológico dos seres humanos (Mattila et al., 2000). Com base em recentes investigações estas moléculas são bastante eficazes perante atividade tumoral, influenciam positivamente o metabolismo de gorduras e açúcares no organismo (Rop et al., 2009) e reduzem os níveis de colesterol no sangue (Manzi et al., 2004).

Muitas fibras podem ajudar a melhorar a cor, a textura e as características sensoriais dos alimentos para além de intervirem na redução do seu valor calórico, com base nas suas propriedades físico-químicas como a sua solubilidade, viscosidade, capacidade de formação de gel, capacidade de ligação à água e ao óleo, capacidade de adsorção e fermentabilidade (Biswas et al., 2011).

Durante o tempo de atuação das fibras no intestino delgado estas vão formando uma camada à superfície da mucosa intestinal que vai atrasar o metabolismo principalmente dos açúcares e gorduras impedindo desta forma a absorção de alguns nutrientes e facilitando o controlo da taxa de glicemia e a estabilização do metabolismo energético (Wascheck et al., 2008). A fermentação das fibras pelas bactérias da flora intestinal permite a redução do pH do meio levando ao aumento favorável da população bacteriana benéfica como os lactobacilos reforçando assim o sistema imunológico inibindo o desenvolvimento e crescimento de bactérias patogénicas e prejudiciais (Wascheck et al., 2008).    

A fibra dietética é reconhecida por ser um componente alimentar que confere proteção contra doenças cardiovasculares, cancro colorectal, obesidade e diabetes (Chaplin, 2003), no entanto, apresentam também propriedades tecnológicas que podem ser utilizadas na formulação de produtos, provocando uma alteração da textura, aumento da estabilidade dos alimentos durante a sua produção e armazenamento.

Por estas razões, a adição de fibras dietéticas aos produtos alimentares confere vários benefícios para o organismo e o seu valor nutricional motiva o consumidor à sua ingestão de forma a assegurar um aporte ideal de fibras de acordo com as recomendações dos nutricionistas.

A importância das fibras alimentares e o seu grande potencial têm levado ao crescimento de um grande mercado de produtos e à procura de novas fontes de fibra como os sub-produtos industriais e agronómicos. Os resíduos agrícolas das produções frutícolas e hortícolas têm sido utilizados para a produção de fibra dietética devido ao seu baixo custo e elevada abundância. Seguindo esta mesma lógica, a produção de cogumelos comerciais, maioritariamente de cogumelos brancos (Agaricus bisporus), é igualmente uma produção agrícola que gera elevadas quantidades de resíduos.

Os cogumelos são muito sensíveis ao manuseamento, colheita e transporte sendo que estas práticas causam lesões irreversíveis devido a uma série de reações bioquímicas resultando na sua descoloração enzimática mediada muitas das vezes pela polifenoloxidase na presença de oxigénio. O acastanhamento que os cogumelos sofrem, a perda de água, senescência e ataque microbiano têm como consequência a degradação das propriedades sensoriais e a perda de qualidade resultando num menor tempo de prateleira e como tal na redução do seu valor nutricional e comercial (Gouzi et al., 2010) sendo o aproveitamento deste tipo de resíduos uma opção bastante rentável.

O desenvolvimento de novos produtos com fibra dietética têm geralmente elevada aceitação por parte do consumidor uma vez que aliam o aspeto tradicional do alimento a benefícios adicionais para a saúde, quando consumidos regularmente, sendo designados de alimentos funcionais (Romero-Lopez et al., 2011; Benassi et al., 2001; Lyly, 2006). Para além do sabor, a textura é também relevante e segundo Lyly (2006) a qualidade sensorial do produto final é tão importante como os seus potenciais efeitos positivos no organismo uma vez que o consumidor pretende alimentos funcionais saborosos e de textura agradável.

As fibras alimentares para além de muito utilizadas na panificação têm uma elevada aplicação em produtos cárneos, tais como salames, patês, salsichas, afiambrados e hambúrgueres melhorando a sua textura e possibilitando a redução do seu teor em gordura devido à sua elevada capacidade de retenção de água e óleo; como apresenta uma coloração esbranquiçada e são isentas de cheiro e sabor são ótimas para ser utilizadas como ingrediente alimentar.

Bibliografia

  1. Synytsya, A., Mícková, K., Jablonský, I., Slukovà, M. e Copíková, J. Mushrooms of Genus Pleurotus as a Source of Dietary Fibres and Glucans for Food Supplements.  Czech Journal of Food Sciences. 2008, 26, 441-446.
  2. Bowman, S. M., Free, S. J. The structure and synthesis of the fungal cell wall. BioEssays. 2006, 28, 799-808.
  3. Fukuda E., Vasconcelos A., Matias A., Barbosa A., Dekker R., Silva M. Polissacarídeos de parede celular fúngica: purificação e caracterização. Semina: Ciências Agrárias. 2009, 30(1), 117-134.
  4. Mantovani M. S., Bellini M. F., Angeli J. P., Oliveira R. J., Silva A. F., Ribeiro L. R. ß-Glucans in promoting health: Prevention against mutation and cancer. Mutation Research. 2008, 658, 154-161.
  5. Cheung P. C. Mushrooms as functional foods, John Wiley & Sons, Inc., Hoboken, New Jersey. 2008.
  6. Mattila P., Suonpää K., Piironen V. Functional properties of edible mushrooms. Nutrition. 2000, 16, 694-696.
  7. Rop O., Mlcek J., Jurikova T. Beta-glucans in higher fungi and their health effects. Nutrition Reviews. 2009, 67(11), 624-631.
  8. Manzi P., Marconi S., Aguzzi A., Pizzoferrato A. Commercial mushrooms: nutritional quality and effect of cooking. Food Chemistry. 2004, 84, 201-206
  9. Biswas A. K., Kumar V., Bhosle S., Sahoo J., Chatli M.K. Dietary fibers as functional ingredients in meat products and their role in human health. International Journal of Livestock Production. 2011, 2(4), 45-54.
  10. Wascheck R. C., Dutra A. R., Grandsire C., Almeida O. C., Moreira S. O. Pectina: Um carboidrato complexo e suas aplicações. Estudos, Goiânia. 2008, 35(3), 343-355.
  11. Chaplin, M. F. Fibre and water binding. Proceedingd of the Nutrition Society, 2003, 62, 223–227.
  12. Gouzi H., Coradin T., Delicado E., Unal M., Benmansour A. Inhibition Kinetics of Agaricus bisporus (J.E. Lange) Imbach Polyphenol Oxidase. The Open Enzyme Inhibition Journal, 2010, 3, 1-7.
  13. Romero-Lopez M.R., Osorio-Diaz P., Bello-Perez L., Tovar J., Bernardino-Nicanor A. Fiber Concentrate from Orange (Citrus sinensis L.) Bagase: Characterization and Application as Bakery Product Ingredient. International Journal of Molecular Science, 2011, 12, 2174-2186.
  14. Benassi V.T., Watanabe E., Lobo A.R. Produtos de Panificação com Conteúdo Calórico Reduzido. B. CEPPA, Curitiba, 2001, 19 (2), 225-242.
  15. Lyly M.  Added ß-glucan as a source of fibre for consumers. Academic Dissertation, Faculty of Agriculture and Forestry of the University of Helsinki, Viikki, 2006.

Regiões

Notícias por região de Portugal

Tooltip