Entrevista às professoras Susana Carvalho e Ruth Pereira "Qualquer produtor que queira permanecer no mercado terá de ir ao encontro das exigências atuais de sustentabilidade ambiental"

O Congresso Internacional “SCAS2022 – Smart and Circular Agriculture towards Sustainability”, teve lugar nos dias 21 e 22 de julho e foi organizado pelo GreenUPorto/Inov4Agro da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto. O evento teve como principal objetivo dar a conhecer projetos em curso na área da agricultura de precisão e agricultura circular, como motores da sustentabilidade, juntando vários atores da fileira nacional e internacional. Em entrevista ao Agronegócios, as professoras e organizadoras do evento, Susana Carvalho e Ruth Pereira, revelaram que o balanço foi extremamente positivo, já que contou com a participação de cerca de 100 participantes de 14 países. Foram apresentadas 25 comunicações orais (cinco "keynotes" estrangeiros) e 41 comunicações em painel, tendo sido dado bastante protagonismo a jovens investigadores. Tiveram ainda lugar duas mesas redondas, nas quais foram integrados elementos da academia e do meio empresarial. Nestas mesas redondas foi promovida uma discussão de aspetos específicos de cada sessão, assim como a integração de aspetos transversais às mesmas, tendo sido também aberta à participação do público presente.

Agronegócios: De que forma as quatro sessões apresentadas ajudam a fundamentar o “Green Deal” e o “Farm to Fork”?

PROFESSORAS: As quatro sessões do evento, e as múltiplas soluções discutidas estão perfeitamente alinhadas com as ações do Pacto Ecológico Europeu, relacionadas com a Agricultura, e ainda, com a Estratégia do Prado ao Prato que o consubstancia. Respondem também a alguns dos objetivos do desenvolvimento sustentável (ODS 12, 13 e 15). No seu conjunto as sessões, compostas por excelentes comunicações orais e em póster, e suportadas pelos diferentes projetos em curso no GreenUPorto, abordaram temas como a necessidade dossier sustentabilidade agrícola 45 de investir numa formação profissional adequada dos futuros agricultores e de outros stakeholders ligados ao setor, para os empoderar para a transição digital que é necessário fazer. Focaram estratégias para uma melhor utilização dos recursos naturais (solo e água). Demonstraram ainda o muito que se investiga e que há ainda para investigar no âmbito do reaproveitamento de resíduos orgânicos, para obtenção de novos produtos de valor acrescentado, para a fertilização dos solos (reduzindo os inputs de fertilizantes químicos de azoto), e ainda para a incorporação de carbono nos solos, de forma a melhorar as suas propriedades e a reduzir as emissões de gases com efeito de estufa (GEE). Respondendo à necessidade de alimentar uma população humana crescente, é ainda importante melhorar a eficácia dos sistemas intensivos de produção, sobretudo no sul da Europa, de forma a torná-los mais eficientes e com uma produção mais próxima do consumidor, reduzindo a ocupação do solo, as cadeias de distribuição, as perdas de alimentos perecíveis e subsequentemente as emissões de GEE. E, por último, não menos importante, uma das sessões foi dedicada a um outro aspeto muito importante, e que é um dos targets da Estratégia do “Prado ao Prato” a alcançar em 2030, a redução em 50% do uso e dos riscos de pesticidas sintéticos. A persecução deste objetivo terá que passar por substituir compostos que já estão na lista dos candidatos a substituição, como é o caso do cobre. E ainda por tirar partido da biotecnologia e da nanotecnologia para obter compostos mais eficientes, que requerem menores doses de aplicação, no combate a pragas e doenças e que representem um menor risco ambiental. A redução do uso de pesticidas sintéticos é reconhecida como fundamental para travar a perda de biodiversidade, para reduzir os impactos nos sistemas aquáticos e subsequentemente na qualidade da água bruta que extraímos para consumo humano e para a produção de alimentos mais seguros e saudáveis, só assim sendo possível alcançar uma “única saúde”.

AG: Este congresso contou com a presença de diversos investigadores de vários países onde partilharam soluções diversas. Existem diferenças na investigação e adoção das práticas que levam a um sistema agrícola sustentável? Se sim, quais?

P: Apesar da especificidade de alguns sistemas agrícolas, de um modo geral as abordagens ao nível da investigação e das soluções encontradas têm os mesmos princípios base: produzir mais com menos. Isto é, maior produtividade/qualidade das culturas, com um uso mais eficiente dos recursos (como a água, fertilizantes, produtos fitofarmacêuticos, energia e solo), por forma a reduzir o impacte ambiental e regenerar a biodiversidade e as funções dos ecossistemas. Para isso é necessário continuar a apostar no melhoramento das culturas, por forma a desenvolver variedades mais resilientes (às alterações climáticas e tolerantes a pragas e doenças), assim como apostar em soluções (bio)tecnológicas e na agricultura circular. O solo é também um recurso fundamental e um aliado nas questões da sustentabilidade agrícola, sendo cada vez mais reconhecido o papel fundamental dos seus microorganismos para uma boa nutrição e para a proteção das culturas contra agentes patogénicos.

AG: Como podemos promover a agricultura circular nos sistemas agrícolas portugueses?

P: Nesta matéria ainda há bastante margem de progresso. É importante estar atento aos subprodutos que a agricultura gera e tentar dar-lhes uma segunda vida. Já muito é feito e exsitem uma série de centros de investigação a trabalhar nestes tópicos, incluindo o GreenUPorto. Porém, há ainda setores em que se podem fazer francos progressos em Portugal. A título de exemplo, peguemos nas culturas sem solo/hidroponia. Em Portugal, a maior parte dos produtores ainda não recorre a sistemas de fertirrega fechados, havendo um enorme despedício de água e fertilizantes que poderiam ser facilmente recirculados (como se faz noutros países). Ainda no que respeita estas culturas, o GreenUPorto está a coordenar um projeto que visa a reutilização dos substratos descartados no final das culturas sem solo (fazendo uma avaliação do risco dos mesmos e encontrando possibilidades de os reincorporar no solo para aumentar o conteúdo em matéria orgânica, assim como outras propriedades do mesmo).

Continue a ler este artigo publicado na edição n.º 44 da Revista AGROTEC, no âmbito do Dossier "Práticas Agrícolas Sustentáveis".

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