Entrevista a Capoulas Santos


Encontrando-se a aprovação final da nova Política Agrícola Comum (2014-2020) apenas dependente de alguns pormenores, a Agrotec foi saber junto do eurodeputado Capoulas Santos, relator do Parlamento Europeu para a nova Política Agrícola Comum (PAC), quais as suas principais linhas orientadoras.
 
Uma política que trará mais exigências ao nível do equilíbrio e proteção ambiental como condição para o acesso a ajudas, mais apoios para a fomentar a organização dos produtores e que tem como objetivo a convergência, até ano de 2020, das ajudas a atribuir por hectare entre os países comunitários.
 
 

 

Grandes Culturas (GC): Neste momento, em que ponto estão as negociações da reforma da PAC?

Capoulas Santos (CS): Existe neste momento um acordo político entre o Conselho de Ministros da Agricultura e o Parlamento Europeu sobre os dossiers que compõem a reforma da PAC, o que significa que a negociação está praticamente fechada. A única coisa que falta é a confirmação formal deste mesmo acordo em ambas as instituições e tal significa um voto na plenária do Parlamento Europeu (PE), provavelmente em novembro próximo, e a subsequente confirmação ao nível do Conselho de Ministros da Agricultura da União Europeia (UE).

 

GC: Em síntese, quais serão as principais linhas orientadoras da nova PAC?

CS: A nova PAC será mais verde e mais equitativa. É uma PAC que serve os agricultores, os consumidores e os cidadãos europeus. As ajudas passarão a ser concedidas por unidade de área, ou seja por hectare, haverá maiores exigências ambientais para o seu recebimento e as novas regras conduzirão a um rearranjo nos destinatários destas ajudas para que os que hoje recebem menos possam, no futuro, receber um pouco mais. Por outro lado, há claras regras de transparência relativamente aos recipientes das ajudas, excluindo superfícies que nada têm a ver com a agricultura, como aeroportos ou campos de golfe. 

 

GC: Já há estimativas para os valores do envelope global de ajudas a atribuir a Portugal?

CS: O envelope financeiro para Portugal já está definido. No próximo período de programação financeira, ou seja entre 2014 e 2020, Portugal receberá um total de 3,6 mil milhões de euros para o desenvolvimento rural e um total de 3,9 mil milhões de euros para os pagamentos diretos.

 

GC: Que influência terá a reforma da PAC na agricultura portuguesa, concretamente nos cereais?

CS: Ao definir uma orientação geral que aponta para um total desligamento das ajudas, apenas um máximo de 15% do valor do envelope nacional dos «pagamentos diretos» poderá continuar ligado à produção, até 2020. A nova PAC pretende tratar todos os setores por igual, quer sejam de sequeiro ou de regadio, passando os «pagamentos diretos» a incluir setores que até aqui deles não beneficiavam, como o frutícola, o hortícola ou o olival. Isto para dizer que, em Portugal, o desenvolvimento, ou não, do setor dos cereais dependerá provavelmente muito mais do mercado, isto é, da oferta e da procura, e das condições agronómicas e dos custos de produção, do que das alterações introduzidas na política agrícola comum.

Os apoios ao investimento não discriminam igualmente qualquer setor em detrimento de outro. Contudo, cada Estado-membro poderá definir prioridades. Desejo que o governo português não discrimine negativamente um setor em que Portugal é tão dependente.

 

GC: Os antigos Estados-membro vão ficar excluídos do acesso ao cofinanciamento para novos regadios, ou não?

CS: Não. Os antigos Estados-membros, entre os quais Portugal, não vão ficar excluídos dos apoios à irrigação. Na proposta inicial da Comissão Europeia era esse o caso, ou seja, não era possível apoiar novas instalações de irrigação nos antigos Estados Membros. Reverter esta questão foi uma das minhas prioridades durante a negociação enquanto Relator para o Desenvolvimento Rural, que acabou por ser aceite pelo Conselho e a Comissão. O regulamento futuro contemplará apoios para novas instalações de irrigação e reparação das já existentes em todos os Estados-membros.

 

GC: Que apoios estão previstos para o associativismo? E para a instalação de novos agricultores?

CS: No âmbito do associativismo, estão previstos apoios para a criação de organizações profissionais e agrupamentos de produtores e ainda para o seu desenvolvimento. Quanto aos novos agricultores, foi-lhes concedida prioridade para a atribuição de direitos a partir da reserva nacional no âmbito dos pagamentos diretos. No âmbito do desenvolvimento rural, há uma série de apoios destinados, por exemplo, a apoiar os agricultores a integrar um sistema de produção de qualidade pela primeira vez, apoios à formação profissional, e outros, que poderão ter especial interesse para os agricultores que iniciam a sua atividade.

Se os agricultores forem não apenas novos mas também jovens, há neste caso uma ajuda específica à instalação, também no âmbito do desenvolvimento rural, e uma majoração obrigatória, no âmbito dos pagamentos diretos, de 25% para os primeiros 25 a 90 hectares, a definir por cada Estado-membro. 

 

GC: Quantos anos vai levar a convergência das ajudas (pagamento-base) a nível nacional e a nível europeu? Será até 2019, ou prolongar-se-á até 2028?

CS: A nível europeu, ou seja entre Estados-membros, há um processo de convergência das ajudas que começa em 2015 e termina em 2020. No final deste processo, nenhum Estado-membro poderá receber menos do que 196 euros por hectare de média (a média atual por exemplo da Letónia é inferior a 100 euros por hectare e, em Portugal, de 186). 

A nível nacional, ou seja dentro dos Estados-membros, haverá um processo de convergência, também a decorrer até 2020, através do qual se promove uma redistribuição interna das ajudas entre agricultores, mas com algumas cautelas de forma a não comprometer a viabilidade económica de alguns setores. Nenhum destes processos de convergência será absoluto até 2020, portanto é provável que, na configuração da nova PAC, se promovam ajustamentos adicionais para o próximo período financeiro.

 

GC: Qual a definição aceite para agricultor ativo (tem de produzir bens alimentares ou pode fazer 100% de greening)?

CS: O agricultor ativo tem que produzir uma atividade agrícola mínima e as superfícies que beneficiam de ajudas não podem estar afetas a entidades que nada têm a ver com o setor, como aeroportos, companhias ferroviárias ou campos de golfe, entre outros, conforme a lista de entidades incluídas numa assim designada lista negativa. 

A título voluntário, os Estados-membros podem ainda restringir a definição de agricultor ativo, excluindo dos recipientes das ajudas entidades cuja atividade económica principal não é agrícola. De qualquer forma, os agricultores que recebem um montante muito baixo de ajudas, podem ficar isentos desta exigência.

 

GC: Qual a área de referência para as candidaturas ao Regime de Pagamento Único (RPU): áreas candidatas em anos anteriores ou outras áreas elegíveis?

CS: A área de referência para as candidaturas ao RPU será, potencialmente, a área que recebeu ajudas em 2013, a que se somará a área das frutícolas, das hortícolas e da vinha.

 

GC: As candidaturas às medidas agroambientais (Produção Integrada e Agricultura Biológica) poderão dispensar os compromissos do greening?

CS: A agricultura biológica produz benefícios ambientais que são considerados de valor superior aos de qualquer cultura convencional sujeita aos critérios de greening, portanto as superfícies sob produção biológica cumprem de forma imediata os compromissos do greening. A produção integrada, por si só, não dispensará o cumprimento dos compromissos do greening.

 

GC: Irão manter-se algumas ajudas ligadas - bovinos, ovinos e proteaginosas - e, em caso afirmativo, de que forma?

CS: Ficou consagrado na legislação europeia sobre a PAC que cada Estado-membro pode reservar parte do seu envelope das ajudas diretas para atribuir pagamentos ligados, nomeadamente até um máximo de 13%, mais 2%, para culturas proteaginosas, ou uma percentagem ainda superior, se devidamente justificado, o que deverá ser o caso de Portugal. A decisão sobre os setores que poderão continuar com pagamentos ligados, caberá ao governo português.

 

GC: Está a aproximar-se do final do 2013. A nova PAC vira a tempo de entrar em vigor já em 2014? 

CS: A nova PAC estará plenamente em vigor em 1 de janeiro de 2014, no que diz respeito ao II Pilar (Desenvolvimento Rural), pese embora que, em termos práticos, só depois de aprovado o programa português pela Comissão Europeia e de publicadas as portarias de execução para cada uma das medidas e disponibilizados formulários de candidatura para as diferentes medidas, tal poderá suceder. A data concreta em que o programa estará em plena execução é, assim, difícil de prever, já que depende da celeridade com que o Governo conclua o processo.

Quanto aos Pagamentos Diretos (ex-RPU), o novo modelo apenas entrará em vigor em 1 de janeiro de 2015, aplicando-se, durante o ano de 2014, um Regulamento de Transição que está neste momento em fase de negociação entre as instituições europeias. ¦

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