Alelopatia

Por: Paulo Rodrigues

Ao longo do tempo, o Homem foi-se apercebendo que certas espécies vegetais interferiam no desenvolvimento de outras, quer positivamente quer, sobretudo, negativamente.

Atualmente, sabe-se que muitas das causas do decréscimo de produtividade devem-se a um fenómeno chamado alelopatia. O termo foi usado pela primeira por Hans Molisch em 1937, derivando de duas palavras Gregas: allelon (para o outro) e pathos (sofrimento) (Ferreira & Aquila, 2000).

A alelopatia é um fenómeno que envolve efeitos benéficos ou adversos, diretos, indiretos ou ambos de uma planta sobre outra, seja esta uma planta de cultura ou infestante, a partir da libertação para o meio ambiente de bioquímicos conhecidos como aleloquímicos. A localização dos aleloquímicos abrange diferentes partes da planta, como por exemplo folhas, ramos, raízes, sendo a libertação destes feita por lixiviação, volatilização, exsudação radicular, decomposição de resíduos, entre outros (Ferguson, Rathinasabapathi, & Chase, 2013).

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Os aleloquímicos são um subconjunto de metabolitos secundários, não necessários para o crescimento e desenvolvimento do organismo produtor. Estes desempenham um papel importante na modelação das interações entre comunidades, como por exemplo em agroecossistemas, onde têm um efeito determinativo sobre o crescimento das culturas e as culturas da próxima estação. Para além destes efeitos, os aleloquímicos podem também contribuir para resistência a doenças e a pragas e subsequentemente conferir vantagem competitiva (Li, Wang, Ruan, Pan, & Jiang, 2010).

A inibição por aleloquímicos é complexa e pode envolver a interação de diferentes classes de químicos como compostos fenólicos, flavonóides, terpenóides, esteróides, alcalóides, hidratos de carbono e aminoácidos, os quais, quando misturados, obtêm um maior efeito alelopático do que se atuassem isoladamente (Ferguson et al., 2013).

Rice (1984) propôs o agrupamento dos aleloquímicos em 14 categorias de acordo com as suas similaridades e prováveis vias de síntese (figura 2).

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Os efeitos alelopáticos podem também ser influenciados por stresses ambientais, fisiológicos, doenças ou pragas, radiação solar, herbicidas e carências nutricionais. Isto mostra que a alelopatia é regulada por vários fatores, os quais estão intimamente relacionados (Pires & Oliveira, 2011).

Estes efeitos são muitas vezes confundidos com competição pelo facto de influenciarem o crescimento e desenvolvimento da planta, mas são fenómenos diferentes, sendo que na alelopatia ocorre a adição de um fator biológico e na competição há remoção ou redução de fatores ambientais (Silva, 2012)

Embora os aleloquímicos tenham persistência no solo, afetando as plantas vizinhas e as que as sucedem, são mais biodegradáveis em comparação com os herbicidas tradicionais, mas também podem ter efeitos indesejáveis como a sua inespecificidade, necessitando por esta razão de estudos ecológicos antes da sua utilização (Ferguson et al., 2013).

Efeitos e a utilização na agronomia

Na agricultura, estudos alelopáticos são de grande importância, contribuindo para o entendimento e modo de utilização destes compostos como herbicidas naturais, mas também, na necessidade de tomar cautelas quando se plantam ou semeiam plantas em conjunto ou em sucessão cultura, e que podem, eventualmente, ser incompatíveis.

Estudos realizados nesta área demonstram que os aleloquímicos interferem em muitos processos metabólicos primários e no sistema de crescimento da planta, nomeadamente na fotossíntese, respiração, assimilação de nutrientes, síntese de proteínas, atividades enzimáticas, permeabilidade da membrana plasmática e desenvolvimento da planta (Pires & Oliveira, 2011).

Existe um grande número de aleloquímicos que podem ser usados como herbicidas naturais, destacando-se pelo elevado potencial alelopático os alcalóides, benzoxazionas, derivados de ácido cinámico, cumarinas e compostos cianogénicos. Na tabela 1 podemos observar alguns herbicidas sintetizados a partir de compostos naturais com ação sobre plantas infestantes.

É possível também o uso de plantas daninhas para o controlo de outras, por meio de lixiviação, produção de exsudação e compostos voláteis. Espécies de plantas daninhas perenes e mundialmente distribuídas, como por exemplo Agropyron repens, Cirsium arvenses, Sorghum halepense e Cyperos esculentus, apresentam grande poder alelopático, mas, no entanto, também podem afetar as culturas por atraso ou impedimento da germinação, redução do crescimento e interferência em processos de simbiose (Pires & Oliveira, 2011).

Porém, existem culturas que apresentam também efeitos alelopáticos, como por exemplo o Triticum aestivum (trigo), Oryza sativa (arroz), Zea mays  (milho), Brassica spp. (canola, couve) e Secale cereale (centeio), em que o efeito está atribuído à decomposição das folhas no campo após a colheita. Na tabela 2 estão presentes culturas que apresentam potencial alelopático, sendo que para o controlo das ervas daninhas estas devem ser bem manejadas, permitindo assim o aumento da produtividade das culturas.

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De referir também que grande parte do efeito inibidor do desenvolvimento de infestantes que é atribuído à casca de pinheiro usada como “mulching” se deve, sobretudo, à libertação, por lixiviação, de compostos alelopáticos que inibem a germinação e crescimento de infestantes. Porém, quando fresca, pode interferir também com o crescimento da planta em cultura.

Recorrendo à biotecnologia é possível também fazer com que uma cultura controle uma determinada infestante, através da incorporação nesta de genes de alelopatia (Vilela, 2009) evitando o recurso a químicos que poderiam afetar negativamente o meio ambiente.

Assim sendo, e resumindo os vários aspetos considerados anteriormente, podemos identificar 3 tipos de estratégias, segundo Pires & Oliveira (2011), para o controlo de plantas daninhas:

  • Transferência de genes responsáveis pela síntese de aleloquímicos;
  • Uso de rotação de culturas;
  • Uso de aleloquímicos obtidos a partir das plantas como herbicidas.

Com o recurso a estas estratégias alternativas de produção e manejo de culturas, é possível reduzir os custos de produção e o impacto do uso de químicos, atenuando assim os efeitos que a agricultura tem no ecossistema, tornando a agricultura sustentável (Silva, 2012).

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Bibliografia

    1. Chou, C. (n.d.). BIOCHEMICAL INTERACTIONS AMONG PLANTS: ALLELOPATHY AS ECOSYSTEM REGULATOR. eolss.net, V. Retrieved from http://www.eolss.net/sample-chapters/c03/E6-54-10-05.pdf
    2. Ferguson, J. J., Rathinasabapathi, B., & Chase, C. A. (2013). Allelopathy?: How Plants Suppress Other Plants 1 Nature of Allelopathy. University of Florida, (July 2003), 1–5. Retrieved from http://edis.ifas.ufl.edu/hs186
    3. Ferreira, A., & Aquila, M. (2000). Alellopathy: an emerging topic in ecophysiology. … at the VII Brazilian Plant Physiology …, (Vii). Retrieved from http://www.cabdirect.org/abstracts/20013082205.html
    4. Li, Z.-H., Wang, Q., Ruan, X., Pan, C.-D., & Jiang, D.-A. (2010). Phenolics and plant allelopathy. Molecules (Basel, Switzerland), 15(12), 8933–52. doi:10.3390/molecules15128933
    5. Pires, M., & Oliveira, V. R. (2011). Alelopatia, (1984). Retrieved from omnipax.com.br/livros/2011/BMPD/BMPD-cap5.pdf
    6. Rice, E.L., 1984, Allelopathy, EUA: Academic Press, New York, 2ª edição. 422p
    7. Rolim, M. L., 2010, Tremoço fungicida amigo do ambiente, Expresso http://expresso.sapo.pt/tremoco-fungicida-amigo-do-ambiente=f600642
    8. Silva, P. S. S. Da. (2012). Atuação dos aleloquímicos no organismo vegetal e formas de utilização da alelopatia na agronomia. Biotemas, 25(3), 65–74. doi:10.5007/2175-7925.2012v25n3p65
    9. Vilela, H. (2009). ALELOPATIA E OS AGROSSISTEMAS. Retrieved April 17, 2013, from http://www.agronomia.com.br/conteudo/artigos/artigos_alelopatia_e_os_agrossistemas.html

 

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