2015: o pior ano desde 2008 para as matérias-primas agrícolas

A maioria das matérias-primas perdeu valor em 2015 – naquele que foi o pior ano agregado, desde 2008 – e o setor agrícola não foi exceção.

A oferta de quase todas as matérias-primas tem sido avultada – e continua a crescer.

A entrada da China, em finais de 2001, na Organização Mundial do Comércio, foi uma lufada de ar fresco para as matérias-primas, que começaram a ganhar terreno logo de seguida. Mas o arrefecimento que entretanto se verificou na China – os receios em torno dessa desaceleração provocaram mesmo um “mici-crash”, no passado dia 24 de agosto, nas bolsas mundiais – trouxe ventos contrários e foi uma das causas da queda dos preços das “commodities”.

Os preços dos alimentos caíram 18% nos últimos 12 meses, devido a uma maior produção de “commodities” agrícolas, sobretudo cereais e café. Ao mesmo tempo, segundo dados da Organização para a Agricultura e Alimentação (FAO), a procura diminuiu no que diz respeito a alguns produtos lácteos e carnes, o que fez aumentar o excedente mundial.

O sub-índice Bloomberg Agriculture – que agrega o café, milho, algodão, sementes de soja, óleo de soja, açúcar e trigo – registou assim a sua terceira queda anual e a mais forte desde 2001.

Mas vamos por partes. Como se comportaram estas principais matérias-primas isoladamente, entre cereais, oleaginosas e outros produtos agrícolas?

cafe

Café perdeu força

O café de tipo arábica registou uma queda de 29,7% no acumulado de 2015, no mercado de futuros nova-iorquino ICE. Isto devido sobretudo às chuvas no Brasil – maior produtor e exportador mundial deste produto – que fizeram florescer as colheitas e aumentar a oferta no mercado.

Ao mesmo tempo que as condições atmosféricas favoráveis aumentam os rendimentos das colheitas, a depreciação das moedas nos países produtores tem incentivado os agricultores a exportarem mais os produtos que lhes rendem dólares.

Cacau a subir pelo quinto ano seguido

O cacau é das poucas matérias-primas que conseguiram chegar ao final do ano com um saldo positivo. É, aliás, a estrela de 2015 no setor das “commodities”. No final do ano, a valorização agregada foi de 10,35%.

Tratou-se do quinto ano consecutivo de subida, e em 2015 a seca provocada pelo fenómeno climatério El Nino na África Ocidental – que levou a uma redução da produção – contribuiu para a sua solidez.

Sumo de laranja ganha com doença bacteriana

Foi um dos poucos produtos de origem agrícola que fechou em alta no cômputo de 2015. O sumo de laranja, que faz parte dos principais índices de “commodities” agrícolas, fechou o ano com um ganho agregado de 0,61%.

A produção tem diminuído, muito à conta de uma doença bacteriana que atinge os citrinos e que se chama “citrus greening”. Só no Estado norte-americano da Florida (que é o segundo maior produtor mundial de laranjas, depois do Brasil), a produção foi bastante dizimada. Esta situação levou a um crescente défice de oferta nos EUA, onde o consumo excede a produção.

A escassez de laranjas para consumo nos EUA tem sido colmatada através da importação de laranjas brasileiras, mas o próprio Brasil depara-se agora com uma queda das suas colheitas em resultado de condições meteorológicas adversas e também do “citrus greening”.

Se a isto juntarmos uma menor produção também na Europa, devido às elevadas temperaturas, estão reunidas as condições para os preços do sumo de laranja manterem a tendência ascendente.

Açúcar vive ano doce depois de quatro em queda

Depois de quatro anos consecutivos a perderem terreno, os preços do açúcar regressaram aos ganhos em 2015. O açúcar não refinado valorizou 5,91% no acumulado do ano.

Só em 2013 e 2014, a cotação do açúcar afundou 25%, com as quedas a reflectirem o excesso de açúcar no mercado – e, consequentemente, com a oferta a suplantar a procura.

acucar

Mas, este ano, a produção da Índia (segunda maior mundial) deverá registar uma quebra de 5% devido ao nível das chuvas abaixo do habitual, o que tem estado a impulsionar as cotações. E conforme recordou recentemente o Barclays, citado pela CNBC, o período de seca observado na Índia em 2009 levou a que os preços do açúcar disparassem para máximos de 30 anos, pelo que se espera que a queda da produção da actual campanha agrícola ajude a sustentar os preços nos mercados internacionais.

Além disso, o maior produtor mundial, o Brasil, tem estado a aumentar a sua produção de etanol – que tem na cana-de-açúcar um ingrediente-chave – porque a população tem reforçado o seu consumo deste combustível alternativo visto ser mais barato do que a gasolina. Por isso, este “desvio” de açúcar para a produção de etanol deverá igualmente contribuir para manter os preços sustentados – ou mesmo para os fazer subir mais.

Trigo e milho com ano negativo

Os preços dos futuros do trigo nos EUA, negociados no mercado de Chicago, estão abaixo da média dos últimos cinco anos, devido à forte produção e aos elevados inventários. E assim deverão permanecer durante mais algum tempo. No cômputo do ano, a queda rondou os 20%.

Na Europa – que representa cerca de 20% da produção de trigo –, este cereal tem estado a desenvolver-se mais rapidamente do que é costume para esta época do ano, dadas as elevadas temperaturas que se têm feito sentir de forma geral no Velho Continente. As culturas de França e da Roménia estão “bastante avançadas” e as geadas de finais da primavera poderão afetar o cereal, advertiu à Bloomberg um consultor em agricultura da Agritel, Michel Portier. Na Rússia, o trigo voltou uma vez mais a ser mais barato do que na Europa devido à queda do rublo, que quase se fixou num mínimo histórico.

Por seu lado, o milho fechou 2015 com um saldo negativo – marcando assim o seu terceiro ano consecutivo no vermelho. Não tanto como o trigo, já que as perdas anuais do milho rondaram os 9%, mas ainda assim com dificuldades em encontrar alguma resiliência – os preços mais baixos reduziram o incentivo para muitos agricultores norte-americanos maximizarem as suas culturas, além de que na União Europeia e na Ucrânia as colheitas foram penalizadas pelo calor e tempo muito seco que se viveu este verão.

Soja e a elevada oferta

Esta oleaginosa registou um recuo de 4,8% no acumulado do ano, pressionada sobretudo pela vasta oferta. E os “stocks” de soja são suficientemente substanciais para manterem os preços sob pressão, sublinhou à Agrimoney o analista Frank Rijkers, do ABN Amro.

Algodão em alta

Esta matéria-prima de origem agrícola, usada na produção têxtil, revelou-se uma surpresa em 2015. Num ano bastante mau para a maioria das matérias-primas (o índice Thomson Reuters/Jefferies CRB, que reflecte o desempenho de 19 matérias-primas caiu para mínimos de 13 anos em dezembro), o algodão teve um desempenho positivo, com uma subida agregada de quase 5%.

A ajudar a este movimento esteve o facto de a China não ter escoado para o mercado tanto algodão como alguns investidores receavam (devido aos subsídios atribuídos esta produção), e isto por causa dos elevados inventários do país, sublinha a Agrimoney.

Além disso, os preços relativamente baixos (o algodão embarateceu 26% no acumulado de 2014) também ajudaram a reduzir a popularidade desta cultura junto dos agricultores. Com efeito, estima-se que a produção da campanha de 2015-2016 diminua. E, a acontecer, será o terceiro ano consecutivo – no ano passado isso não foi um fator de sustentação porque também o consumo baixou (o esperado aumento da procura por parte das moagens, que se estimava que aconteceria devido à diminuição dos preços, não se concretizou).

Fonte: Negócios

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