Sistemas agroflorestais de sucessão em Portugal

Os sistemas agroflorestais de sucessão são um modelo de agrofloresta típico de regiões tropicais e que tem vindo a ganhar notoriedade um pouco por todo o mundo. Apesar de muito recentes em Portugal, e na Europa em geral, estão em franco crescimento e a despertar a atenção da comunidade científica.

(Fotografia de Pedro Nogueira, Associação Terra Sintrópica)

Têm como pilares a estratificação vertical e a sucessão natural de espécies biodiversas, com dinâmicas ao nível do espaço e ao longo do tempo, e procuram criar sistemas de produção de alimentos com elevada biodiversidade inspirados em ecossistemas florestais. Dois levantamentos de sistemas já implementados realizados, em 2019 e 2020, respetivamente, procuraram caracterizar a realidade portuguesa e tentar compreender as potencialidades e limitações desta nova abordagem agrícola e agroflorestal.

Em particular no que diz respeito ao Modo de Produção Biológico (MPB) estes sistemas podem vir a dar um contributo para o aumento de resiliência às alterações climáticas e para a sustentabilidade das explorações numa lógica de transferência de conhecimento. A elevada dependência de trabalho manual e de conhecimento muito específico para a correta gestão dos sistemas agroflorestais de sucessão contribui para a sua dificuldade em ser aplicado em maior escala.

A contínua procura por novas soluções, quer tecnológicas quer ao nível de desenhos mais simplificados, contribuirá para a sua aproximação a outros modelos agrícolas pelo que o estudo destes sistemas revela-se de grande importância para o futuro.

Portugal

Historicamente a Europa tem uma grande tradição no uso de modelos agroflorestais tendo a sua prevalência diminuído ao longo dos anos (Mosquera-Losada et al., 2012). Atualmente a agrofloresta ocupa cerca de 3,3 milhões de hectares na Europa, principalmente em Espanha, Portugal e Itália com alguma áreas menores em França e Áustria (Herder et al., 2017).

Partindo da mais recente classificação de sistemas agroflorestais na Europa, desenvolvido pela Federação Europeia de Agroflorestas (EURAF, 2021), poderíamos classificar os SAFS como uma combinação de três tipos de sistemas: os Sistemas Agroflorestais em faixas (Alley cropping), Jardins de árvores multi-estrato (Multi-layer tree gardens) e os Pomares consociados (Orchard intercropping).

No levantamento dos SAFS em Portugal efetuado em 2020 por Leitão et al (2021) o total da área implementada com SAFS não ultrapassava os 10 hectares e os sistemas caracterizavam-se por uma grande heterogeneidade entre si, ao nível do desenho dos campos, dimensões e espécies utilizadas. No entanto, e embora ainda sem grande expressão em Portugal, verifica-se um crescimento exponencial de iniciativas a que não é de estranhar o enquadramento histórico de Portugal no que diz respeito às agroflorestas.

Potencialidades

É no campo das potencialidades que o estudo dos SAFS se torna mais relevante. A vasta publicação científica referente a benefícios agronómicos e ambientais com o uso dos diversos modelos agroflorestais, torna plausível esperar que a presença de linhas de árvores em grande densidade como ocorre nos SAFS também promova ganhos ao nível da gestão da água, do sequestro de carbono, da reciclagem de nutrientes, do controlo biológico natural de pragas e doenças e, também, na prevenção dos incêndios (Sollen-Norrlin et al. 2020).

A resiliência que os SAFS aparentam apresentar perante o cenário de alterações climáticas para os próximos anos é de alguma forma traduzido pelo predomínio destes sistemas em explorações localizadas nas regiões do Ribatejo, Alentejo e Algarve. De referir que a multiplicidade de produtos gerados nos SAFS pode contribuir, ainda, para a resiliência económica da exploração, pois podemos ter condições climáticas favoráveis a uma ou várias espécies em detrimento de outras, situação variável ao longo dos anos, ganhando mais relevo no cenário atual de grande volatilidade de preços nos mercados.

O modelo policultural pode ainda contribuir para a resiliência do sistema quando associado a circuitos curtos de comercialização e venda direta quer pelo lado da produção quer pelo rendimento gerado, em geral, mais distribuído no tempo de que são exemplos mais comuns, nos SAFS portugueses, a entrega de cabazes semanais.

Agricultura Biológica

O contributo da agrofloresta para a agricultura biológica tem sido recentemente apontado como uma aposta de futuro (Rosati et al. 2020) e, na nossa opinião, os SAFS são modelos privilegiados para o desenvolvimento do MPB em Portugal. A procura pela simplificação e a combinação com novas tecnologias facilitará a incorporação de técnicas inspiradas nos SAFS em modelos de MPB no sentido de conseguir um melhor aproveitamento dos vários Serviços de Ecossistema para a produtividade e rentabilidade gerais.

Futuro

Neste sentido, o estudo mais aprofundado dos SAFS torna-se necessário quer para confirmação das suas potencialidades quer para gerar conhecimento que possa ser transponível para outros sistemas, no sentido de contribuir para uma transição global para modelos agrícolas/agroflorestais mais resilientes e sustentáveis.

Neste último ponto é de realçar a grande compatibilidade da maioria das práticas levadas a cabo nos SAFS com os “Regimes Ecológicos” (Eco-Schemes) propostos para serem incluídos no primeiro pilar da Política Agrícola Comum, na reestruturação em curso para 2023-2027.

Desta forma, o estudo das várias práticas agrícolas presentes nas SAFS pode constituir uma ferramenta para a sua adoção por outros agricultores permitindo um rendimento extra e uma maior circularidade a que acresce, ainda, a crescente valorização das agroflorestas como prestadores de serviços remunerados no mercado do Carbono (Kay et al. 2019).

Nota de Redação

Artigo publicado na edição n.º 41 da Revista Agrotec.

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