«A cultura do pistácio está a fazer o seu caminho»
José Martino, CEO da consultora agrícola Espaço Visual, fala, nesta entrevista da cultura do pistácio, e não tem dúvidas: «a cultura pode enraizar-se mais pelo país se a gestão das ajudas financeiras públicas de apoio ao investimento forem regionalizadas com prioridade para serem atribuídas por aquelas regiões muito deprimidas do Interior de Portugal». O especialista em gestão agrícola fala ainda do trabalho da Espaço Visual e da Fruystach no panorama do setor agrícola nacional.
Fotos: Espaço Visual
Agronegócios/AGROTEC: Gostava de começar esta entrevista falando da cultura do pistácio. Em termos de dimensão, o que nos pode dizer da produção, zonas e regiões com condições efadoclimáticas favoráveis à produção da cultura?
JOSÉ MARTINO - A cultura do pistácio está a fazer o seu caminho como cultura que se está a implantar em Portugal, está a ser colocada no terreno pelos empresários mais abertos à inovação e aos riscos, bem como às novas atividades, que são sensíveis às culturas agrícolas com forte potencial de rentabilidade, que gostam de diversificar o respetivo portefólio, que entendem o potencial de mercado e as mais valias dos frutos secos para a saúde do consumidor, que procuram produtos para serem exportados. Estão a ser implantados alguns milhares de hectares de pistácio sobretudo por investidores vindos de fora da agricultura que têm como prioridade encontrar investimentos de longo prazo, em linha com a procura de mercado, fáceis de gerir porque têm operações culturais muito mecanizadas, pouco exigentes em mão de obra. As regiões mais favoráveis para o desenvolvimento da planta do pistácio são aquelas que apresentam muitas horas de frio de inverno, muito calor de verão, zonas onde a primavera e o outono são estações do ano muito curtas, com baixa probabilidade de chuva nos meses de abril e setembro para ajudarem ao vingamento dos frutos e à sua colheita sem humidade, respetivamente. Correspondem grosso modo, aos distritos de Bragança, Vila Real, Guarda, Castelo Branco, Portalegre, Évora e Beja, embora dentro destes se devam procurar os concelhos que melhor cumpram as condições de clima indicadas acima. Cumulativamente devem procurar-se solos muito bem drenados, ricos em cálcio, com pH próximo ou acima de 7 (pH neutro ou alcalino).
AG: Em termos de produção que dados pode dar da cultura no país?
JM: Os dados a produção portuguesa são muito baixos e os mesmos indicados pelo INE para os últimos anos porque são necessários 5 a 7 anos para se terem as primeiras produções e 7 a 10 anos para se atingir a plena produção.
AG: A Fruystach nasceu em 2015 e foi fundada por produtores de pistácio que tinham como objetivo ajudar nas produções, armazenamento, secagem e comercialização. Que balanço pode ser feito até agora?
JM: A Fruystach está a integrar empresários como accionistas, aqueles produtores que já têm projetos de pistácio, avelã e nozes, implantados, está a dar-lhes assistência técnica à formação das plantas e tratará do descasque, secagem, embalagem e comercialização quando houver produções. A estratégia que está a percorrer é semelhante à que foi utilizada nos pequenos frutos com a Bfruit, esta empresa começou em 2013 com poucos accionistas fundadores e hoje é uma organização de produtores reconhecida com quase 200 produtores e um volume de negócios superior a sete milhões de euros. O balanço que se pode fazer é que está a ser cumprido o plano de negócios que presidiu à formação da Fruystach.
AG: De que forma a cultura pode enraizar-se mais no país? Que constrangimentos à produção ainda existem?
JM: A cultura pode enraizar-se mais pelo país se a gestão das ajudas financeiras públicas de apoio ao investimento forem regionalizadas com prioridade para serem atribuídas por aquelas regiões muito deprimidas do Interior de Portugal. Além disso, é preciso que o calendário de abertura de concursos para recepção das candidaturas, respetivas análise, aprovação e contratação seja cumpridas com rigor dentro dos prazos legais, eliminar esta incerteza que existe de se estar há quase 2 anos à espera dos resultados processuais dos projetos já submetidos. É necessário que todos os projetos de jovens agricultores aprovados sejam financiados. É chocante que precisando Portugal de uma reforma estrutural de rejuvenescimento dos seus empresários agrícolas, com maior acuidade e incidência nas regiões muito deprimidas económica e socialmente, não sejam apoiados financeiramente os projetos com investimentos nestes locais, em particular e todos os demais projetos já aprovados, em geral. Estes estrangulamentos existem com o pistácio, só tem aptidão em regiões do Interior profundo, que compete com projetos do litoral e de regiões mais competitivas, são reais, são um barreiras efetivas a uma das poucas atividades com forte potencial de rentabilidade económica, mas pelo contrário, muito exigente em termos financeiros porque é um investimento que demora muitos anos a entrar em produção e atingir a plena produção, pelo que deveria ter outro apoio bancário de crédito de médio longo prazo, este não existe.
AG: Quanto à comercialização, em que ponto estamos e quais as principais dificuldades no mercado interno?
JM: Na comercialização não há dificuldades porque a procura internacional ultrapassa largamente a oferta. Tal como nos pequenos frutos o seu foco comercial será a exportação em detrimento do mercado interno que tem baixo poder de compra e consequentemente, têm limitações na valorização das produções.
AG: Em termos de exportação, que panorama temos e que países são propícios à mesma?
JM: A exportação é realizada sobretudo para Espanha, há potencial para exportar para os países do centro e norte da Europa. É preciso que em Portugal se chegue rapidamente aos 5000 - 8000 ha de produção para se ter uma quantidade de oferta mínima que mostre a regularidade da oferta, impacto nos mercados e receptores e alta qualidade das produções da origem Portugal.
AG: O que falta, em termos de impulso, para ajudar esta cultura tão peculiar?
JM: É preciso que o tempo passe para que o impulso à alavancagem e promoção da cultura do pistácio se tornem efetivos e reais.
AG: Ao nível do consumo, têm dados? Quais os níveis de consumo nacionais?
JM: O consumo de pistácio em Portugal é baixo porque é um produto sem tradição nos nossos alimentares e ao mesmo tempo é caro para o poder de compra do português da classe média.
AG: Que objetivos gostava de ver alcançados para futuro em termos de apoio à cultura?
JM: A minha ambição a longo prazo é fazer da cultura do pistácio a mais rentável dentro dos frutos secos, conseguir que um grupo alargado de produtores das regiões mais deprimidas de Portugal ganhe dinheiro, se possível, muito dinheiro, com esta atividade agrícola, tal como o fiz em 30 anos de trabalho de organização da fileira, técnico, associativo e de consultoria com a cultura do kiwi e mais recentemente, estou a percorrer o mesmo caminho com a fileira dos pequenos frutos. O apoio que procuro é aquele que as equipas da Espaço Visual e Fruystach conseguem dar à cultura através de recolha, análise, consolidação, adaptação à realidade de solos e climas de Portugal e disseminação dos conhecimentos recolhidos a nível internacional do know how de produção e comercialização dos pistácios.
(Continua).
Nota: Este artigo foi publicado na edição n.º 28 da Revista Agrotec.
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