Vinhos do Algarve: «80% da produção é consumida na região»

A Região Demarcada do Algarve foi criada em 1980 e contempla atualmente quatro zonas produtoras de vinhos de “Denominação de Origem Protegida”: Lagos, Lagoa, Portimão e Tavira. Carlos Gracias, presidente da direção da Comissão Vitivinícola do Algarve (CVA), fala ao Agronegócios do crescimento dos vinhos do sul nos últimos anos. O esforço na reconversão das vinhas e os avultados investimentos nas adegas são, para o responsável, os principais impulsionadores da realidade vitivinícola algarvia. Nos últimos seis anos o número de agentes económicos duplicou sendo que contam-se atualmente 30 produtores no total. «O mercado interno é o nosso mercado por eleição e para o qual são realizadas mais de 80% das expedições», afirma Carlos Gracias.

vinhos

Agronegócios: Cada vez mais os vinhos do Algarve conquistam reconhecimento e renome, não só nacional como internacionalmente. Mas até há poucos anos não era assim. Quando se deu o salto para os vinhos algarvios e por que razão eles não eram falados?

Carlos Gracias: Os vinhos do Algarve deixaram de ser falados porque a partir da década de 70 do século XX, a aposta da região foi a criação de infraestruturas para o turismo. Como tal não acompanhamos o desenvolvimento e muito menos o investimento que outras regiões fizeram na área vinicola. Muitas das vinhas abandonadas foram, entretanto, recuperadas quer por produtores algarvios ou seus descendentes quer por produtores que se instalaram na região trazendo conhecimento e outra forma de abordar a produção do vinho. Há também uma modernização na aplicação de novos conhecimentos adquiridos através de um cuidado investimento na formação que muito tem contribuido para que os Vinhos do Algarve sejam procurados e elogiados. O salto qualitativo deu-se na década de 2000, não só pelas razões apontadas mas muito pelo enorme esforço despendido pelos produtores com a reconversão das suas vinhas e nos avultados investimentos realizados nas adegas. A qualidade hoje associada aos “Vinhos do Algarve” são consequência dessa realidade, pois para se produzir bons vinhos temos que ter uma matéria-prima de excelência e ótimas condições de laboração. Salientamos ainda o grande contributo e o incontornável trabalho desenvolvidos por todos os enólogos e viticultores que colaboram com os produtores do Algarve.

AG: Nos últimos dez anos, qual foi a evolução do setor na região?

CG: Em termos práticos o facto que mais caracterizou as alterações verificadas nos últimos anos foi a instalação de inúmeros projetos privados com “vinhos de quinta” que levaram ao aumento significativo da qualidade do produto vínico produzidos e ao aumento do volume de vinho certificado e comercializado. A produção total vínica da região tem-se mantido mais ou menos constante nos últimos anos, o que se verificou, foi sim, um aumento do volume de vinho de qualidade comercializado, nomeadamente como “Vinho Regional Algarve”. Gostava ainda de referir que nos referidos projetos de reconversão, foram utilizadas as melhores castas nacionais e internacionais produtoras de grandes vinhos, bem adaptadas à região que potenciaram o acréscimo de qualidade. A par deste processo, as castas autóctones não foram esquecidas, sendo instaladas em quase todas as novas plantações, nomeadamente as castas brancas como a “Moscatel” “Crato Branco/Síria” ou o “Arinto”, assim como a “Negra Mole” considerada uma das mais antigas castas nacionais, que está confinada ao território do Algarve e que poderá dar origem a vinhos diferenciadores e característicos da região.

AG: Hoje quantos produtores existem?

CG: Nos últimos seis anos o número de agentes económicos duplicou. Atualmente são 30 produtores que certificam e introduzem no mercado produtos vínicos. Acreditamos que o crescimento irá continuar já que a procura para instalação de novas vinhas continua.

Fatores distintivos

AG: O que distingue os vinhos e as castas algarvias?

CG: A sua localização que é única e a diversidade dos solos, são dois dos aspetos que distinguem a região do Algarve que é fortemente marcada pela influência do clima mediterrânico e atlântico. Estes dois aspetos conferem características únicas aos nossos vinhos, ao que se acrescenta o fator humano que lhe veio conferir o devido aproveitamento das qualidades enunciadas pelo “Terroir”, quer os vitivinicultores, quer os enólogos inseriram nos Vinhos do Algarve o conceito de “vinhos de autor”, procurando o bom equilíbrio entre os açúcares e a acidez, acrescentando uma componente aromática que resulta em vinhos bem produzidos, elegantes e fáceis de beber.

AG: Qual o posicionamento estratégico para o setor na região?

CG: Pretendemos que os “Vinhos do Algarve” se afirmem pela qualidade, mais do que pela quantidade. Estamos a crescer na forma correta que é a forma sustentada, imprimimos uma dinâmica muito própria que se revela por exemplo na forma empenhada com que atualmente estamos a aumentar a produção de vinhos do Algarve, brancos e rosados, respeitando as necessidades da região que como se sabe tem uma grande atratividade turística que tem apetência pelo consumo de produtos vinicos frescos em harmonia com o clima do Algarve. Registamos com agrado que 80% da produção é consumida na região sem descurarmos a promoção da marca “Vinhos do Algarve” no exterior, sobretudo para exportação que começa a ter alguma representação.

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Carlos Gracias, presidente da direção da CVA

AG: A nível internacional, qual é o vosso posicionamento e quais são os mercados onde estão presentes?

CG: Gostaríamos de ter maior vocação exportadora. Mesmo assim 15% do volume produzido anualmente tem como destino a exportação, sendo que a maior fatia provém da aquisição direta feita pelo turista que visita a região algarvia.

AG: Que outros mercados internacionais são aposta de futuro?

CG: O mercado interno (CE) é o nosso mercado por eleição e para o qual são realizadas mais de 80% das expedições. Temos ainda exportações pontuais para vários continentes, nomeadamente África (Angola), Ásia (China), América do Norte (EUA E Canadá).

AG: Qual é o orçamento anual da CVA e qual o grosso do investimento?

CG: Somos uma pequena organização com três colaboradores, cumprimos com todas as exigências legais de funcionamento e estamos acreditados pelo IPAC pela NP EN ISO 17065:2014 como Organismo de Certificação de Produtos. A nossa única e exclusiva receita são os serviços prestados no âmbito da certificação dos produtos vínicos com DO e IG, onde os recursos humanos absorvem a maior fração do orçamento. Apresentamos ainda candidaturas a fundos comunitários e nacionais para financiamento das ações de promoção, nomeadamente ao Eixo 1 do IVV para a Promoção Genérica. Vimos ainda aprovada uma candidatura ao SIAC Algarve (CRESC ALGARVE 2020) a desenvolver no decorrer dos anos de 2016 e 2017, e que irá financiar a instalação de um Laboratório de Enologia, o desenvolvimento de um programa informático para gestão do processo de certificação, implementação do processo de certificação do Medronho do Algarve IGP, estudos sobre a região, quintas e adegas, seminários e assessoria de comunicação.

1,2 milhões de litros de vinho produzidos em 2015

AG: Em média, qual a produção anual?

CG: Produzimos em 2015, 1,2 milhões de litros de vinho, dos quais entram no mercado, 1 milhão de garrafas de vinho certificado. Atualmente somos a CVR mais pequena do país, quer em volume quer em estrutura, mas a Região Vitivinícola do Algarve já produziu no passado mais de 6 milhões de litros de vinho anuais.

AG: De uma forma geral, como analisa o setor vitivinícola nacional?

CG: O setor vitivinícola nacional é forte e está bem organizado e estruturado, é dinâmico e inovador e penso que tem grandes potencialidades para crescer, nomeadamente através do incremento das exportações.

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AG: Quais os principais problemas que ainda persistem?

CG: Em particular dos “Vinhos do Algarve”, temos que investir mais em Marketing e na Comunicação. Temos uma boa e diversificada oferta vínica e agora precisamos de fazer chegar essa “notícia” a outros locais que não a região do Algarve, é importante que as pessoas peçam vinho algarvio quer seja na restauração como nos supermercados. Temos de sensibilizar a restauração regional para a mais-valia que é a promoção dos produtos locais e para o valor da oferta dos vinhos da região aos turistas que nos visitam como uma experiência inesquecível.

AG: Tendo em conta que os vinhos portugueses se assumem como um dos nossos maiores bens nacionais – pelo contributo para o PIB, exportações, etc. – acha que o país tem sabido aproveitar as oportunidades?

CG: Que bem estariam todos os setores económicos portugueses se tivessem a dinâmica do “Portugal do Vinho”. Temos aproveitado as oportunidades disponíveis e trabalhado muito e bem o vinho. Temos sido dinâmicos, aproveitando todos os apoios disponibilizados e temos investido corretamente na reconversão da vinha e o crescimento das exportações está a ser muito significativo. A Viniportugal tem feito também um excelente trabalho na promoção do vinho no estrangeiro, têm estado presente em Feiras e eventos um pouco por todo o mundo, o crescimento tem sido sustentado e é perfeitamente visivel. Os Vinhos do Algarve querem contribuir ainda mais para esse crescimento já que somos uma importante janela de visibilidade para o mundo exterior, é que sempre são, pelos números oficias, mais de 16 milhões de dormidas.

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