Utilização de extratos de algas como suplemento nutritivo em fruticultura

Utilização de extratos de algas como suplemento nutritivo em fruticultura

Por: Mariana Mota, DCEB - Horticultura/CEER, Instituto Superior de Agronomia

INTRODUÇÃO

Existe atualmente uma grande diversidade de produtos fertilizantes à disposição dos agricultores. Os fertilizantes mais comummente utilizados são compostos por sais que contêm os nutrientes vegetais em formas solúveis e muito concentradas, que são sintetizados industrialmente. No entanto, há casos em que os fertilizantes são obtidos de depósitos geológicos ou produzidos a partir de algas, como é o caso dos extratos de algas. Estes últimos têm suscitado grande interesse, não só pelo seu valor nutritivo como pela aparente melhoria na absorção de elementos nutritivos inorgânicos do solo. Considera-se ainda que contribuem para reduzir a incidência de ataques de fungos e insetos, na medida que promovem mecanismos de resistência natural a doenças e pragas.

A UTILIZAÇÃO DE ALGAS EM AGRICULTURA

Durante séculos, as áreas agrícolas próximas de zonas costeiras utilizaram algas como valiosa fonte de matéria orgânica para variados tipos de solos e para muitas culturas. A prática comum envolvia misturar as algas com areia, deixar entrar em decomposição e depois enterrar. Para utilização em zonas mais afastadas do litoral, procedia-se à secagem das algas no local de colheita antes do transporte. As algas castanhas foram as mais utilizadas por serem as mais abundantes, destacando-se dentro destas as algas Ascophyllum nodosum (Fig. 1) ou Ecklonia maxima e também algas do género Fucus. Algas vermelhas como as espécies Phymatolithon calcareum e Lithothamnion corallioides, algas muito ricas em calcário, foram também usadas para neutralizar solos ácidos. 

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A base do efeito benéfico das algas não é ainda totalmente clara, mas este foi relacionado com a atividade biológica de citocininas, auxinas, giberelinas, aminoácidos e betaínas que se encontram na sua composição e também com a presença de outros constituintes, como diversos micronutrientes e hidratos de carbono insolúveis, cujo elevado teor contribuía para melhorar o arejamento e estrutura do solo, aumentando a sua capacidade de retenção de água.

Tendo por base estes efeitos benéficos, mais recentemente, a indústria procurou otimizar a utilização destes fertilizantes de origem natural, recorrendo ao processamento das algas primeiro para preparação de farinhas e, mais recentemente, para preparação de extratos. Os extratos e suspensões têm conseguido melhor aceitação que as farinhas ou as próprias algas não processadas. São vendidos em formas concentradas, mais fáceis de transportar, diluir, aplicar e atuar rapidamente. Os mais comuns são produzidos à base das algas castanhas, variando as espécies com os países. Alguns são preparados por extração alcalina, removendo-se tudo o que não é solúvel. Outros são apresentados na forma de suspensão de partículas muito finas, mas a preparação mais comum envolve a lavagem, congelação e trituração, até se obterem partículas de 6 a 10 µm, que depois se homogeneizam, obtendo-se um líquido concentrado que inclui todos os constituintes da alga.

EFEITOS DOS EXTRATOS DE ALGAS

Têm sido realizados diversos estudos em condições controladas para avaliar o potencial fertilizante e estimulante dos extratos de algas, que têm dado resultados distintos. No entanto, considera-se que os extratos de algas castanhas induzem melhorias no vingamento, no tamanho do fruto e no rendimento, entre outros mecanismos através do estímulo da síntese de poliaminas endógenas, e aumentam a absorção de nutrientes do solo, a produção de antioxidantes, contribuindo também para uma melhor proteção contra stresses bióticos (ex: ácaros, afídeos) e abióticos (ex: geada), na medida em que estimulam as defesas naturais. Têm também um potencial fertilizante apreciável, apesar de serem frequentemente bastante deficientes em fósforo, pois são ricos em azoto, potássio e diversos micronutrientes. Neste contexto, é apenas de salientar que a deficiência em fósforo deve ser tida em conta, na medida em que é muito mais acentuada que nos estrumes habituais ou nos fertilizantes N: P: K de síntese.

Efeitos na nutrição

A melhoria na absorção de nutrientes é uma bandeira defendida pelos fabricantes de extratos de algas, em particular em relação ao azoto e ao fósforo. O efeito sobre o azoto prende-se com o seu elevado teor em manitol, uma substância que potencia a atividade enzimática da nitrato-reductase (Fig. 2), uma enzima fulcral no metabolismo de assimilação do azoto, (Fig. 3). Além desta enzima, também as fosfatases, enzimas necessárias para a absorção de fósforo registaram um aumento considerável, cerca de 700% mais que o controlo, sugerindo a contribuição também para uma maior eficácia na absorção de nutrientes.

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Outros resultados experimentais de estudos envolvendo a aplicação de extratos de algas revelaram já aumentos de absorção de 11% para o azoto, 7% para o enxofre, 10 % para o magnésio e manganês após a aplicação do produto em trigo, e de 5 a 15% para o boro na beterraba.

O teor em micronutrientes, não sendo elevado, pode ser bastante útil, permitindo em certos casos a utilização do extrato de algas em substituição de outros fertilizantes (ex: quelatos de ferro).

A aplicação de um extrato de algas à base de A. nodosum resultou, para além do que já foi dito, num aumento das concentrações de clorofila (relevante em termos de potencial fotossintético) nas folhas tratadas em comparação com as folhas não tratadas (Fig. 4), propondo os autores que este aumento de clorofila se deve às betaínas presentes nos extratos de algas.

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Efeitos sobre as poliaminas

As poliaminas são substâncias que ocorrem naturalmente em plantas e funcionam como promotores de crescimento. As poliaminas mais importantes, a putrescina, a espermidina e a espermina, são compostos naturais presentes nas plantas, que estão envolvidos na multiplicação e na diferenciação celular durante a organogénese, floração e desenvolvimento inicial do fruto. As poliaminas reduzem as taxas de senescência nos tecidos de algumas plantas devido ao antagonismo com o etileno e são especialmente importantes em situações de stress.

Pensa-se que os extratos de algas aumentam a síntese endógena de poliaminas e retardam a sua degradação, atuando sobre o desenvolvimento de flores e seus componentes, de modo a aumentar a capacidade reprodutiva e a resistência dos órgãos reprodutivos em ocasiões de stress.

APLICAÇÃO EM FRUTICULTURA

Há já muitas culturas em que estes efeitos benéficos têm sido verificados, entre as quais o tomateiro, pimenteiro, macieira, cerejeira e videira, nomeadamente para uva de mesa. Destas culturas, aquela que tem revelado melhor resposta tem sido a última. É preciso referir, no entanto,  que por vezes o efeito varia com a variedade, por exemplo, estudos em batateira revelaram que numa variedade o extrato era muito benéfico, mas noutra era totalmente ineficaz.

No âmbito da fruticultura, em kiwi, verificou-se que a aplicação foliar de um extrato de algas de Ascophyllum nodosum aumentou o tamanho dos frutos e proporcionou um avanço na maturação de cerca de 10-15 dias. Resultados idênticos foram obtidos aquando da aplicação de um extrato desta mesma alga em citrinos, tendo aumentado o calibre e avançado a maturação. Um outro resultado obtido em citrinos prende-se com o aumento da tolerância à seca em plantas de viveiro submetidas a rega deficitária.

Em oliveiras da variedade Koroneiki, o extrato de alga Ascophyllum nodosum teve um efeito muito benéfico na qualidade e na produção do azeite, tendo conferido ao azeite menor acidez sem ter interferido nos fenóis totais. Ainda no que se refere à qualidade do azeite, registou-se níveis mais elevados de ácidos linolénico e oleico, e níveis inferiores para os ácidos palmitoleico, esteárico e linoleico nas modalidades onde foi aplicado azoto, boro e extrato de algas. A aplicação do extrato de algas conferiu também um aumento dos teores foliares de potássio, ferro e cobre e redução do manganês. O efeito sobre o cobre é especialmente importante, na medida em que traz consequências positivas na permeabilidade da membrana das células, na atividade enzimática referente à respiração celular e fotossíntese. Também em oliveira, mas da cultivar Galega, a aplicação do extrato de algas beneficiou significativamente o vingamento, não se tendo verificado na Cobrançosa efeito semelhante. No entanto, nesta última, e ao contrário do que aconteceu com a Galega, a aplicação do extrato de algas nos tecidos reprodutivos (flores, frutos recém-vingados, frutinhos em desenvolvimento) induziu efeitos positivos na atividade de enzimas do metabolismo do azoto, nomeadamente da nitrato-reductase.

Em pereira, a aplicação de extrato de Ascophyllum nodosum conferiu benefícios em termos de rendimento e de qualidade (diâmetro e distribuição de calibres, peso do fruto, número de sementes). Igualmente em macieira, a aplicação do extrato de algas conferiu também benefícios, que foram relacionados com o aumento da síntese das poliaminas.

DECISÃO SOBRE A UTILIZAÇÃO DE EXTRATOS DE ALGAS

Para além dos aspetos fitotécnicos anteriormente mencionados, um aspeto muito importante a ter em conta na tomada de decisão sobre a utilização do extrato de algas é o aspeto económico. Antes da decisão de aplicação do produto, é necessário ter em conta se é uma opção atrativa ou não em termos da relação custo-benefício. Os resultados experimentais obtidos até à data mostram alguns feitos benéficos em termos de rendimento das culturas e da melhor absorção dos nutrientes disponíveis, sugerindo que possa ser possível reduzir a aplicação de outros fertilizantes. É necessário balancear esta vantagem económica com o custo da aplicação do produto.

No modo de produção biológico, os extratos de algas surgem como uma alternativa para a fertilização muito interessante, na medida em que são produtos de origem natural.   

Em conclusão, pode dizer-se que há ainda muito para estudar e clarificar no modo de ação dos extratos de algas, mas que estes parecem ser um fertilizante natural com grande interesse e que Portugal, tendo uma grande faixa costeira, poderá explorar mais esta fonte natural de riqueza para a agricultura.

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