Too Good To Go: A aplicação que combate o desperdício alimentar
A Too Good To Go é uma aplicação pioneira que tem como objetivo combater o desperdício alimentar e capacitar os seus utilizadores a terem um papel ativo e a contribuir para um mundo melhor. Depois do sucesso que está a ter em Lisboa, a plataforma chega agora ao Porto, onde já conta com 50 estabelecimentos aderentes.
Texto e Fotos: Sofia Cardoso
O processo é simples. O consumidor instala a aplicação gratuita no seu telemóvel, insere a localização e encontra as ofertas dos restaurantes aderentes, que oferem sempre as denominadas magic boxes feitas a partir das sobras do dia que não serão vendidas. Cada caixa deve ser deter quantidades três vezes superior ao preço que o consumidor paga pela respetiva. Após a compra, realizada a partir da app, o utilizador dirige-se ao restaurante e recolhe a sua encomenda. Assim, além de poupar no custo do que seria uma refeição normal, o consumidor ajuda a combater o desperdício, impedindo que os alimentos acabem no contentor.
Presente em Lisboa desde outubro do ano anterior, a Too Good To Go apresentou agora o início de funções na cidade do Porto, segunda cidade portuguesa a beneficiar da iniciativa. Num espaço envolvente e acolhedor, localizado no centro da cidade, a country manager Madalena Rugeroni deu a conhecer um pouco mais sobre a aplicação, a missão da entidade e o desperdício alimentar que existe na conhecida Invicta.
«Medimos o sucesso da aplicação a partir do número das refeições salvas»
Madalena Rugeroni começou por referir que o desperdício alimentar é, atualmente, «um tema que nos preocupa a todos», realçando a preocupação crescente do consumidor com as questões ambientais e com a sustentabilidade. «Atualmente, um terço dos alimentos a nível mundial não são consumidos. Todos os anos, 50 toneladas de alimentos por segundo são desperdiçadas», afirma, defendendo que se trata de um problema grave a nível ambiental, pois 8% dos gases de estufa emitidos são responsabilidade do desperdício alimentar; um problema social, sendo que cerca de 800 milhões de pessoas que passam fome e as restantes estão a desperdiçar recursos; e económico, pois o desperdício equivale a cerca de 1,3 triliões de euros por ano. «Se o desperdício alimentar fosse um país, este seria a terceira maior nação do mundo», refletiu.
Em relação a Portugal, os dados também não são os mais animadores, refletindo que existe um milhão de toneladas de desperdício por ano, o que equivale a cerca de 50 mil refeições desperdiçadas nos restaurantes por dia. O mais preocupante, segundo a country manager, é que «20% do nosso lixo são produtos que poderiam ser consumidos». Em relação ao Porto, cerca de 14 mil toneladas são desperdiçadas anualmente. Contudo, já existem iniciativas da Lipor e da Câmara do Porto, a Embrulha e a Dose Certa. «Se 50% do desperdício alimentar no Porto fosse evitada, a cidade poderia deixar de perder cerca de 10 milhões de euros por ano», afirma.
Com a chegada da app Too Good To Go a Portugal, Madalena Rugeroni acredita que tal ajudará a melhorar a questão, passando muito pela aposta na prevenção. «Medimos o sucesso da aplicação a partir do número das refeições salvas, quantidade de CO2 que salvamos e a quantidade de pessoas que inspiramos. Em Portugal, até 2024, queremos, pelo menos, inspirar 6 milhões de pessoas».
De facto, os resultados alcançados são positivos. Em apenas três meses de presença em Lisboa, a app já salvou 18 mil refeições e já colabora com 350 estabelecimentos. Só em janeiro já foram salvas oito mil refeições.
Madalena Rugeroni define a aplicação como uma solução "win-win-win": os utilizadores têm acesso a comida de qualidade por preços reduzidos e conhecem novos estabelecimentos; o meio ambiente beneficia ao evitarmos que a comida acabe no lixo e optimizando os recursos; os estabelecimentos ganham novos clientes e cobrem custos de produção/fazem receita extra de produtos que iriam para o lixo.
«Somos bem mais que uma aplicação, somos um movimento que atua em várias frentes», sendo estas o marketplace, as residências, os negócios, a política e a educação. «Para 2020, o nosso objetivo é ter mais de 75 milhões de utilizadores e lançar programas educativos em mais de 500 escolas, bem como conseguir uma parceria com, pelo menos, cinco governos».
Antes de terminar, a country manager destaca que o trabalho também se estende a apoiar ONG's. «No caso de Portugal, trabalhamos com a Refood e a Casa. Somos como um complemento. Através da aplicação, as pessoas podem também doar, bem como os estabelecimentos que trabalham connosco podem reverter a receita extra que têm para essas organizações».
O desperdício alimentar na cidade do Porto
Seguiu-se uma apresentação de um representante do departamento de Planeamento, Investigação e Desenvolvimento da Porto Ambiente. «A Porto Ambiente, no âmbito da sua atividade como entidade responsável pela recolha dos resíduos urbanos no Município do Porto, promove e contribui activamente para a Economia Circular e todas as iniciativas que lhe estão associadas, tal como a redução do desperdício alimentar. A Too Good to Go com este projeto, é um bom exemplo disso mesmo, desempenhando um papel significativo na circularidade do sistema, evitando a produção de resíduos, numa crescente tendência de desperdício zero», afirmou Hélder.
Sobre a Too Good To Go, o representante destaca que «para nós, este tipo de projeto é uma satisfação. Não nos podemos focar só na recolha, mas também na prevenção. Na economia circular, o mais importante é prevenir. Caso não aconteça, temos que o tratar e valorizar».
Em relação aos problemas da cidade, o representante realçou que «no Porto, 23% dos resíduos indiferenciados são resíduos orgânicos, que resultam em cerca de 23 a 26 mil toneladas anuais. O problema é bem maior do que nós normalmente conseguimos transmitir às pessoas».
«No caso do sistema da Lipor, com quem trabalhamos, a valorização dos resíduos orgânicos ocorre através da compostagem. Transformarmos o resto da comida num produto final chamado Nutrimais e que é utilizado na agricultura. O ano passado chegamos às seis mil toneladas de recolha que foram tratadas. O Porto Ambiente recolhe, a Lipor trata», conta-nos.
Atualmente, já são 780 os estabelecimentos aderentes na separação dos resíduos orgânicos no Porto. «Já recolhemos na componente residencial, na zona de Boavista, com 1700 aderentes, o que se traduziu em 250 toneladas recolhidas em 2019. Além disso, o aterro é pouco significativo no Porto, cerca de 2%. O futuro do Porto é expandir a recolha às residências», defende.
Com vários projetos em cima da mesa, em junho, 30% da população irá receber um contentor pequeno, de cozinha, para as pessoas separarem logo de início os resíduos que utilizam na preparação das refeições alimentares. Além disso, serão instalados contentores próprios para tal, sendo que, só os aderentes poderão aceder aos mesmos, através de cartões de acesso. Esta medida acontece para os contentores permanecerem fechados e evitarem problemas de cheio com os resíduos orgânicos.
Além destas iniciativas, a Porto Ambiente está envolvida num projeto europeu, o City loops, e o Porto é uma das seis cidades laboratório para os resíduos alimentares, que pretendem criar uma ferramenta para os cozinheiros e melhorar a recolha.
«Nós temos o objetivo de estarmos presentes em 18 cidades até ao final do ano»
Em declarações à revista Tecnoalimentar após o evento, Madalena Rugeroni afirma que Portugal «foi escolhido por um conjunto de fatores. Existia uma oportunidade grande de fazermos a diferença, no sentido em que havia cerca de um milhão de toneladas desperdiçadas por ano, mas também porque já estavamos presentes em Espanha e fazia sentido expandir a iniciativa para a Península Ibérica». Em relação à escolha das cidades, a country manager afirma que a app já está disponível para instalação em qualquer região do país e que, se a mesma atingir um número considerável de inscritos, torna-se uma cidade a ponderar. Para o Porto, importou a densidade populacional, o interesse dos consumidores e o número elevado de estabelecimentos.
A country manager conta-nos que a próxima aposta é Faro e surgiu devido ao interesse dos consumidores da região. Contudo, a Too Good To Go tem grandes planos para 2020. «Nós temos o objetivo de estarmos presentes em 18 cidades até ao final do ano. O nosso mote é crescimento rápido e, portanto, queremos lançar este movimento a todo país»,
Em relação à angariação de parceiros, Madalena Rugeroni conta-nos que «tem sido cada vez mais fácil» encontrar empresas interessadas, muito devido à crescente notoriedade da temática. «Começam a existir muitos estabelecimentos a vir ter connosco, no primeiro mês era o contrário. Neste momento já recebemos in bounds.
É importante realçar que o controlo da qualidade e segurança acontece. «Nós trabalhamos com os parceiros e eles são os responsáveis pela comida que colocam na magic box. Contudo, temos um sistema de ratings e reviews em que estamos sempre atentos. Neste momento, o nosso rating ronda os 4.7 em 5. Depois existem ratings específicos para quantidade, qualidade, serviço, entre outros. Se existe algum problema com algum dos segmentos, entramos em contacto de imediato. Temos ainda uma equipa de success, que faz o acompanhamento aos consumidores e parceiros».
Em termos de países, a Too Good To Go está presente na Europa e, há cerca de um mês, chegou aos Estados Unidos. Madalena Rugeroni acredita no potencial da aplicação em solo português.