Glasgow soube a pouco: houve avanços, mas insuficientes e recuo final em relação ao carvão foi desastroso

  • 15 novembro 2021, segunda-feira
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As medidas adequadas no combate à crise climática exigiam uma resposta satisfatória em todos as frentes: mitigação, adaptação, financiamento e justiça climática. Em nenhuma delas esta COP cumpriu inteiramente. 

Contudo, se o texto final não agrada inteiramente a ninguém, não deixa de ser uma base para progressos futuros. No final, a emenda proposta pela Índia de considerar a redução do uso de carvão ao contrário da sua eliminação é lamentável e mostra a enorme dependência de muitos países deste combustível fóssil em particular que é um elemento fundamental da descarbonização global. Esta COP não assegurou 1,5°C, mas deixou uma porta entreaberta para tentarmos lá chegar. A COP26 vai assim a prolongamento na Cimeira do Clima no Egito em 2022, tempo extra que temos o dever de usar sabiamente.

Artigo 6 sobre o mercado de carbono: regras ficaram definidas mas há aspetos graves de falha de integridade

O Artigo 6 do Acordo de Paris, que estabelece as regras para os mercados globais de carbono, precisava de um novo ímpeto. A ideia de um mercado global de carbono é a de, essencialmente, permitir que os países paguem a outros para cortarem as emissões, contando a redução para os objetivos do pagador, e sendo deduzida do recebedor. Os países têm sido incapazes de chegar a um acordo sobre a regulamentação do mercado de carbono, e em Glasgow os focos de desacordo mantiveram-se como obstáculos. A maioria dos países estava preocupada com a ausência de regras que prevenissem a dupla contagem – onde tanto o pagador como o recebedor contam as reduções para os seus próprios objetivos –, com alguns países com créditos de carbono acumulados do passado a quererem valer-se deles, mas outros a dizerem que a utilização de créditos antigos não proporciona as necessárias novas reduções nas emissões.

Por outro lado, alguns países ricos opõem-se à canalização por parte dos países vulneráveis de uma pequena parte das receitas do mercado de carbono para o financiamento da adaptação. No entender das ONGs signatárias, o mercado de carbono não é um instrumento imprescindível na mitigação das emissões e financiamento climático. Mas ao fazer parte do Acordo de Paris, importa garantir a sua integridade, transparência e funcionalidade; infelizmente, também aqui Glasgow não cumpriu.

Alguns elementos falharam, nomeadamente a possibilidade de transferir créditos de projetos antigos para o novo mecanismo, garantias de salvaguarda dos direitos humanos e o mecanismo para evitar a dupla contagem, apesar de estabelecido, carece do escrutínio necessário. Reconhecendo.se assim que diversos elementos ficaram muito aquém, o livro de regras de Paris ficou encerrado.

Uma cimeira necessária, útil, mas ainda assim insuficiente

As medidas adequadas no combate à crise climática exigiam uma resposta satisfatória em todas as frentes, na da mitigação, adaptação, financiamento e justiça climática. Em nenhuma delas esta COP cumpriu inteiramente. Ficámos bem aquém de assegurar uma trajetória que garantisse um aquecimento não superior a 1,5°C em relação à era pré-industrial.

Em essência, apesar de vários representantes do Norte global (entre os quais a UE e os seus Estados-Membros), avançarem com metas ambiciosas no combate às alterações climáticas, por vezes esta ambição concretiza-se através da exportação dos impactos ambientais negativos para países terceiros, nomeadamente para países africanos e asiáticos, que têm menor capacidade de regulação e fracas capacidades técnicas ou financeiras para responderem da melhor forma a estes desafios Estas práticas incoerentes simultaneamente expõem os países em desenvolvimento às consequências de políticas e metas definidas pelos países ricos para a descarbonização das suas economias e enfraquecem a posição dos países ricos como líderes mundiais no combate às alterações climáticas.

No final, a emenda proposta pela Índia de considerar a redução do uso de carvão ao contrário da sua eliminação é lamentável e mostra a enorme dependência de muitos países deste combustível fóssil em particular que é um elemento fundamental da descarbonização global. Trata-se de um status quo iníquo, para a resolução do qual a 26ª Cimeira do Clima não deu os contributos necessários.

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