Determinação do teor de humidade de um solo vitícola recurso à amplitude do sinal do GPR (Ground Penetrating Radar)

artigo científico

Por: João Azevedo, , Sinergeo Lda., Vila Verde | Teresa Mota, , Departamento de Experimentação da EVAG, Paçô AVV | Jorge Oliveira, , Sinergeo Lda., Vila Verde | Bruno Pereira, , Sinergeo Lda., Vila Verde


Neste trabalho apresentam-se os resultados obtidos em experiências controladas numa parcela de cv vinhão, realizadas com o GPR (Ground Penetrating Radar) na Quinta Campos Lima, com o intuito de verificar a capacidade desta técnica em detectar variações superficiais da taxa de humidade. Este trabalho focou-se essencialmente na avaliação da capacidade em obter dados oriundos da reflexão da onda electromagnética na superfície do solo para determinar possíveis correlações entre as variações da amplitude do sinal e o teor de humidade presente na camada mais superficial. 

Ao GPR foi acoplada uma antena de 800 MHz. Foram efectuados dois perfis em dois períodos climáticos distintos e, simultaneamente, foram realizadas medições do teor de humidade usando o sensor de humidade TethaProbe ML2x, com o intuito de comparar os valores de amplitude com as taxas de humidade medidas pelo sensor. Os resultados apontam para a existência de uma correlação entre os valores da amplitude e a humidade no solo.

 

 

Figura 1. Imagem aérea da Quinta Campos Lima (Google Earth) com indicação da parcela de vinha estudada 

 

Introdução

Para calcular o teor de humidade presente no solo são comummente utilizados: métodos baseados na leitura da resistividade eléctrica em sensores enterrados em diferentes pontos e a diferentes profundidades; métodos gravimétricos, ou métodos indirectos, através do estado hídrico da planta (potencial foliar de base ou do ramo, temperatura das folhas ou do coberto, variação do diâmetro do tronco, fluxo de seiva). Apesar da elevada precisão dos métodos, devido ao seu carácter pontual, são geralmente limitados a pequenas áreas determinadas por amostragem. Ora, para monitorizar grandes áreas ocupadas por vinhas (e outras culturas), são necessárias técnicas e métodos que permitam mapear rapidamente essas áreas, com precisão compatível com o tipo de dados obtidos, e de modo totalmente não destrutivo, possibilitando a repetibilidade destes ensaios (Azevedo et al., 2011).

O GPR é uma técnica geofísica que usa energia electromagnética para mapear o subsolo. A energia electromagnética emitida é transmitida para o solo, sendo modificada e parcialmente reflectida pelos contrastes na interface entre os diferentes materiais presentes no subsolo.

Estes contrastes dependem das propriedades desses materiais, nomeadamente a permissividade (e), a constante dieléctrica (er), e permeabilidade magnética (µ), cujos valores modificam a amplitude e a velocidade de propagação das ondas emitidas. O teor de humidade está relacionado com esses parâmetros, que são obtidos através de diferentes tipos de ensaios.

Na banda de frequências usadas pelo GPR, a velocidade de propagação da onda electromagnética (EM) é principalmente determinada pela constante dieléctrica, (er), a qual possui valores próximos de 80 para a água, entre 3 e 10 para os principais minerais constituintes do solo, e 1 para o ar (Annan, 1998 in Paixão, 2006).

Este estudo prosseguiu no âmbito do projeto AGROCONTROL, co-financiado pelo “ON.2 – O Novo Norte” e QREN através do Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER), e tem por objectivo, recorrendo ao GPR, estudar metodologias alternativas para a determinação do teor de humidade no solo, inicialmente em áreas de vinha e posteriormente extensível a outras culturas. 

  

Localização geográfica

Uma das parcelas em estudo situa-se na Estação Vitivinícola Amândio Galhano (EVAG) na Quinta Campos de Lima, no concelho dos Arcos de Valdevez, e está inserida numa região apta à produção do DOC Vinho Verde. A vinha em estudo compreende apenas a cv Vinhão, encontrando-se explorada em Modo de Produção Biológico (MPB), certificada pela EcoCert Portugal (Silva et al., 2010).

A Quinta Campos Lima encontra-se situada numa vertente exposta a sul na margem direita do Rio Lima (Figura 1). Possui uma área agrícola de 70 ha dos quais 33,7 ha com aptidão para a cultura da vinha. Dotada de uma vasta rede de ensaios vitivinícolas e de infraestruturas de apoio, a EVAG, é pois uma unidade experimental, que através dos seus trabalhos pretende dar resposta aos problemas dos seus vitivinicultores, assumindo o papel de veículo mobilizador das suas potencialidades contribuindo, deste modo, para o desenvolvimento e modernização da vitivinicultura da Região Demarcada dos Vinhos Verdes (Armada, 1990).

Na Quinta Campos Lima podemos distinguir três zonas topograficamente distintas: uma de encosta, com altitude que varia entre os 80 e 100 metros; uma de encosta armada em socalcos largos, de altitudes que variam entre os 30 e 80 metros; e uma zona de baixa, de altitudes compreendidas entre 20 e 30 metros, que se estende ao longo da margem do rio Lima.

No que se refere à exposição, para a cultura da vinha, e tendo em conta a latitude onde a Quinta se encontra, esta será a mais favorável, devido à influência do ensombramento e à insolação recebida (Armada, 1990).

O solo da parcela C5, utilizada para o estudo, está classificado como um Antrossolo de Surriba Normal. Trata-se de um solo espesso, com elevados riscos de erosão, de permeabilidade moderadamente lenta e de drenagem externa e interna regular, teor baixo em coloides minerais e baixo a médio em matéria orgânica e elevada capacidade de armazenamento de água útil (217,0 mm). Trata-se de um solo ácido, com baixo teor em azoto, muito baixo teor em fósforo e potássio, baixo teor em bases de troca, e muito fortemente lixiviados. O baixo nível de matéria orgânica associada a uma textura muito ligeira fazem com que este solo se caracterize por uma fraca capacidade de retenção de água, o que poderá no futuro trazer graves problemas de alimentação hídrica e mineral (Armada, 1990).

 

Enquadramento geológico

A Quinta Campos Lima localiza-se na margem direita do Rio Lima, rio este que atravessa a área cartografada segundo a direção E-NE, sendo desviado para NE-SW alguns quilómetros a jusante e encontra-se profundamente influenciado pela tectónica regional (Figura 2). Grandes falhas compartimentam a região envolvente à Quinta segundo a direcção NNE – SSW e são responsáveis pela morfologia actual da envolvente.

A Quinta localiza-se sobre uma mancha granítica muito extensa que ocupa grande parte da Carta Geológica de Portugal 5-B (Ponte da Barca) constituindo uma área essencialmente montanhosa com relevos importantes. Verifica-se a existência de vários tipos petrográficos de granitos com texturas e composições diversificadas, predominando os granitos porfiróides calco-alcalinos.

Localmente, as unidades geológicas relevantes são o granito e os depósitos modernos de aluvião.

O maciço granítico, que corresponde ao substrato rochoso da parcela objecto de investigação, encontra-se fortemente diaclasado segundo as direcções E-W/84°S, N10°E/78°W, N16°E/60°W e N58°W/62°NW, sendo esta última a direcção principal de fracturação observada (Figura 3). 

Dos ensaios realizados no terreno com o recurso ao trado oco, foi possível verificar a espessura muito grande de manto de alteração.

 

 

Figura 2. Extracto da Carta geológica 5-B – Ponte da Barca, com indicação da área (círculo vermelho) sobre a qual incidiu a caracterização geológica

 

Figura 3. Pormenor de uma falha e plano de falha (foto da esquerda). Pormenor da intensa alteração do granito observada num talude (foto da direita)

 

Material e métodos

A determinação da variação do teor de humidade através do GPR pode ser realizada recorrendo a diferentes métodos, sendo cada um deles caracterizado por diferentes equipamentos, processos e dados obtidos (Charlton, 2000; Huissman et al., 2003; Lunt et al., 2005; Azevedo et al., 2011). Como o objectivo do projecto Agrocontrol é o de conseguir obter informação qualitativa sobre o teor de humidade de modo fiável e rápido, a técnica escolhida para ser estudada foi a da “reflexão à superfície”, que se baseia na obtenção de perfis, onde é registada a amplitude de reflexão da superfície do solo. Este método consiste em colocar uma antena a uma altura suficientemente elevada de modo a que o sinal de onda directa seja distinto do sinal da reflexão da superfície do solo. A Figura 4 ilustra o equipamento destinado a manter a antena à altura estipulada, e a permitir percorrer rapidamente as longas distâncias características desses terrenos.

Desta forma, os radargramas obtidos correspondem à “força de reflexão” do solo que depende do contraste (portanto da diferença) entre as constantes dieléctricas dos materiais em “jogo”, nomeadamente o ar, o solo e o teor de humidade. Enquanto a er do ar é 1, a do solo varia em função da sua mineralogia e em função do teor de humidade. Tendo em conta que a er da água é de 81, torna-se evidente que um solo seco terá uma constante dieléctrica menor que um solo saturado. Consequentemente, um solo molhado reflectirá mais energia que um solo seco, resultando, respectivamente, numa amplitude maior e menor nas condições estudadas.

As medições foram realizadas entre 2 linhas no canto SW da parcela, numa extensão de 10,4 metros (Figura 5). Foi utilizada uma antena de 800 MHz, com uma elevação acima do solo de cerca de 40 cm, cujo espaçamento entre o transmissor e o receptor é fixo e de 14 cm. O intervalo entre os pontos de aquisição é de 0,2 m, e uma janela temporal de 10,2 ns, o que representa cerca de cinco traços de radargrama por metro. Foram realizadas duas campanhas para obter dados em duas condições de humidade distintas, uma característica do período de Inverno e outra de Primavera.

A primeira campanha decorreu no dia 25 de Fevereiro de 2011 com o solo ainda húmido após um período chuvoso, e no dia 8 de Abril de 2011, correspondendo a um período climatérico mais seco. Foram medidos os valores do teor de humidade do solo, com o sensor ThetaProbe (Soil Moisture sensor Type ML2x) ao longo do mesmo perfil para comparação com os valores da amplitude do sinal da onda reflectida pela superfície do solo.

Os radargramas adquiridos foram posteriormente processados com o software especializado. Este processamento teve como finalidade a aquisição dos valores das amplitudes do sinal para comparação com os valores obtidos com o sensor de humidade.

 

Figura 4. Equipamento usado no trabalho de campo com a antena acoplada a cerca 40 cm do solo

 

 

 

Figura 5. Localização das videiras alinhadas no sentido NNW-SSE (compasso 3mx2m) e dos perfis de GPR realizados

 

Resultados e discussão

Para obter valores de teor de humidade natural do solo foram efectuadas medições com recurso ao sensor TethaProbe ML2X, com espaçamento de um metro e ao longo da perfilagem efectuada com o GPR.

A Tabela 1 apresenta valores dos teores de humidade obtidos nas duas campanhas, em período chuvoso e período seco com o sensor TethaProbe ML2X.

Relativamente aos resultados obtidos com o GPR, vários problemas surgiram inicialmente, tais como: (1) o impacto da rugosidade do terreno; (2) a definição da altura da antena acima da superfície do solo; (3) o efeito causado pelo coberto vegetal e (4) a definição da configuração dos parâmetros do sinal da antena. 

Depois de efectuada a calibração do equipamento, foi possível iniciar a aquisição de radargramas de forma sistemática, bem como a medição dos teores de humidade natural com o sensor TethaProbe ML2X. A Figura 6 ilustra um exemplo do radargrama de dados de reflexão da superfície do solo adquiridos com a antena de 800 MHz instalada no equipamento ilustrado na Figura 4.

A partir dos radargramas, e recorrendo a uma folha de cálculo, foi possível discriminar os valores de amplitude da onda reflectida pela superfície do solo. O afastamento da antena relativamente ao solo permite diferenciar claramente o sinal da onda directa do sinal da onda reflectida (Figura VI). Os resultados da amplitude da onda reflectida obtidos com a antena de 800 MHz são coerentes com os resultados medidos com o sensor de humidade apresentados na Tabela 1, ou seja, observa-se que, em tempo mais húmido o valor da amplitude é maior do que em tempo mais seco. Verifica-se claramente uma diminuição do valor da amplitude do sinal sempre que há uma diminuição do teor de uma humidade medido com o sensor.

Adicionalmente, traçando o gráfico que relaciona a taxa de humidade no solo com o valor da amplitude do sinal registado por GPR, verifica-se existir uma zona de Primavera e uma zona de Inverno (Tabela 2 e Figura 8). Nesse sentido, parece possível atribuir a determinados valores de amplitude de sinal uma determinada percentagem de humidade.

Durante o ciclo de 2011, foi medido o potencial foliar de base em 3 datas (Figura 9) e nas videiras onde foi testado o GPR. O valor atingido a 2 de Agosto (-0,43 MPa) já é considerado de stress para a casta em estudo (Teixeira 2011). Este resultado revela a importância de estender as observações com o GPR no período que medeia entre o pintor e a maturação.

 

Tabela 1. Valores de teor de humidade obtidos com o ThetaProbe no dia 28 de Fevereiro 2011 (período mais chuvoso) e no dia 8 de Abril de 2011 (período mais seco)

 

 

Figura 6. Exemplos de radargramas obtidos a) com a antena de 800 MHz; b) após processamento através da filtragem de baixas frequências e determinação da força de reflexão, c) a linha amarela indica os picos de amplitude máxima da onda directa ao solo

 

Figura 7. Variação espacial da amplitude do sinal da onda directa ao solo nas duas campanhas efectuadas 

 

Figura 8. Relação entre a amplitude do sinal e a humidade do solo

 

Tabela 2. Valores da amplitude do sinal reflectivo vs % de humidade no solo

 

Figura 9. Potencial hídrico de base 

 

 

 

Projeto WineSulFree da Universidade de Aveiro premiado

O projecto WineSulFree de «Produção de vinho sem sulfuroso utilizando uma película de quitosana», desenvolvido por investigadores do Departamento de Química (DQ) da Universidade de Aveiro (UA), venceu o prémio Investigação do AGROFOOD iTECH. Esta iniciativa, enquadrada no SIAG – Salão Internacional de Agro-Negócios, que decorreu em Santarém nos dias 28 e 29 de Março, pretendeu seleccionar, divulgar e premiar projectos tecnológicos inovadores com potencial de comercialização. 
 A investigação premiada da UA, seleccionada entre as 80 que se apresentaram a concurso oriundas de instituições nacionais de Ensino Superior, desenvolveu uma forma de produzir vinho branco sem recurso à adição de anidrido sulfuroso. A inovação da equipa do DQ, liderada pelos investigadores Manuel Coimbra e Cláudia Nunes, consiste na adição, durante a produção do vinho, de uma película constituída por um polissacarídeo chamado quitosana que é extraído, por exemplo, das cascas dos caranguejos e dos camarões ou de fungos, e que substitui o sulfuroso.
O método, que conserva as práticas enológicas comuns a todas as adegas, é único no mundo e pretende revolucionar a indústria vinícola. Isto porque o sulfuroso, que é adicionado nas várias etapas da vinificação para evitar a proliferação de microrganismos que degradam o vinho e as oxidações que o acastanham, é um composto químico ao qual nem toda a gente reage bem. As reacções alérgicas que pode provocar tornam proibido o consumo de vinho para muitas pessoas. Até agora.
Fonte: Universidade de Aveiro

 

 

Conclusões

Foi utilizado o GPR para mapear a taxa de humidade no solo de modo a obter informação relevante para a gestão da rega. Os resultados mostram que foram obtidas importantes relações entre os valores de amplitude do sinal de GPR através do método por reflexão à superfície, correlacionáveis com os valores obtidos pelo sensor TethaProbe. 

Apresenta-se promissora a utilização deste método para inferir sobre a quantidade de humidade numa determinada área de vinha bem como correlacionar o atributo amplitude com características dos solos. Para estabelecer valores estatísticos mais fiáveis será necessária a realização de mais ensaios e obtenção de mais dados ao longo do ciclo (abrolhamento, floração, pintor, maturação) e correlacioná-los com as necessidades hídricas da videira.

Estão ainda assim por aferir completamente alguns parâmetros, nomeadamente qual a melhor altura para a realização deste ensaio, tendo em conta o tipo de solo e a rapidez com que a água se evapora ou é absorvida, e por outro lado, apreciar a eficácia do equipamento em manter a fiabilidade de resultados em diferentes épocas do ano e para o mesmo solo. ¦

 

 

 

 

 

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