Por: Gabriela Cruz
A degradação dos solos no mundo
No Mundo a degradação dos solos agrícolas devido aos processos de erosão e compactação é, possivelmente, um dos principais problemas que afectam a capacidade produtiva da agricultura. Segundo a Pimentel, David e outros autores, entre 1935 e o ano de 1995, aproximadamente 1/3 dos solos agrícolas do planeta deixaram de ser produtivos devido aos processos de erosão.
Estes fenómenos afectam também todos os países da Europa em menor ou maior extensão, sendo a zona mediterrânica a mais afectada e onde os fenómenos são mais severos. Segundo Oldeman, L.R, (ISRIC- World Soil Information) 12% da superfície total da Europa, e 2 vezes a da França, sofre, anualmente, com a erosão hídrica e 4% com a erosão eólica. Estima-se que a taxa média de erosão é assim de 17 toneladas por hectare por ano, superando, nas zonas mais afectadas, e largamente, valores de 20 a 40 toneladas de solo por hectare após uma chuvada. Estes valores superam aquilo a que estudiosos da matéria estimam como a taxa média de formação do solo de 1 tonelada por hectare por ano (Troeh, F.R. and Thompson, L.).
Portugal, situado na zona Atlântico-Mediterrânica, é provavelmente um dos países da Europa com mais risco de erosão, tendo a EEA – Agencia Europeia do Ambiente (www.eea.europa.eu) considerado que mais de 80% do território português se encontra sujeito a um risco moderado a elevado de fenómenos de erosão.
A qualidade do solo, medida pelo seu teor em matéria orgânica, e que determina a sua fertilidade e consequente potencial produtivo, é muito inferior nos solos que sofreram fenómenos de erosão. Além disso, a capacidade de armazenamento de água é francamente reduzida, sofrendo as culturas consideravelmente mais nas zonas que não podem ser irrigadas, e levando a um maior consumo de água nas zonas de regadio, com o consequente aumento no consumo de energia na rega. Por outro lado, com a não mobilização ou mobilização reduzida aumenta-se a densidade aparente do solo, a estabilidade dos agregados, a respectiva porosidade, a sua capacidade de retenção da água e nutrientes e a sua actividade biológica. Assim, reduz-se a compactação do solo, tornando-o mais resistente à deformação e permitindo melhores condições de transitabilidade do equipamento agrícola, possibilitando ao agricultor um melhor timing nas operações culturais.
Nas zonas áridas ou de fraca pluviosidade, o grande factor limitante é a água, tendo-se observado que a manutenção de resíduos vegetais (restolhos e palhas) à superfície do solo pode diminuir, consideravelmente, a evaporação da água, evitando o stress hídrico das culturas.
Agricultura de Conservação (AC) como resposta à degradação dos solos
Os agricultores dispunham até aos anos 40 do século XX de muito poucas ferramentas, praticamente só a charrua, para controlarem as infestantes, descompactar o solo e preparar a cama para a sementeira. Nas faculdades de todo o Mundo estudava-se que uma boa lavoura não só permitia estes feitos como também aumentava a capacidade de armazenamento da água e era um meio de controlo eficaz de pragas e doenças.
No entanto, 3 anos de seca estrema na parte central dos E.U.A. originaram fenómenos
de erosão muito fortes conhecidos pelo DustBowl e constantes do filme “A charrua que devastou as planícies”. Perderam-se, então, e irremediavelmente, enormes quantidades de solo. Assim, a partir desse momento, e com o objectivo de evitar os devastadores fenómenos de erosão, desenvolveram-se naquele país alfaias que permitiam mobilizar o solo para a sementeira sem o inverter, o que permitia que os resíduos vegetais da cultura anterior permanecessem à superfície do solo. Rapidamente estas práticas estenderam-se a todas as zonas dos E.U.A., porque, além de constituírem um meio eficaz de controlo da erosão, permitiam conservar a humidade no solo, factor tanto mais importante quanto menor ou nula a disponibilidade de água para regar. Além disso, a constituição do Departamento de Conservação do Solo naquele país incentivou a investigação e experimentação em mobilização de conservação, gerando um conjunto de respostas em termos de equipamento. No entanto, persistia o problema de controlo de infestantes, factor altamente limitante para as culturas. Esta dificuldade foi, de certa forma, resolvida com o aparecimento das substâncias activas paraquato e diquato o que motivou a que a Investigação e o Departamento de Agricultura estadunidense e empresas particulares continuassem o esforço de desenvolvimento de respostas aos problemas que a tecnologia enfrentava. Assim, nascia na Universidade de Purdue o primeiro semeador de sementeira directa, M-21, e posteriormente desenvolveu-se o conceito do disco de corte ondulado que permitia cortar os resíduos vegetais deixados pela cultura anterior, evitando o empapamento do semeador e permitindo que os raios solares incidissem no solo e aumentassem a sua temperatura. Simultaneamente, aparecia outro herbicida: a atrazina. A partir daqui, rapidamente aumentou a área em mobilização de conservação nos E.U.A.
Nos anos 70-80 estas técnicas expandiram-se para o resto da América do Norte, para a América do Sul, para a Austrália e para a Nova Zelândia, representando (segundo Derpsch, R.) em 2009 a área de sementeira directa relativamente à área semeada: 23% nos E.U.A., 60% no Brasil, 60% na Argentina, 65% no Paraguai. Segundo Crabtree, B., a adopção por parte dos agricultores no Oeste da Austrália era, em 2004, de 82%, e representava 9 milhões de hectares.
Um pouco mais tarde investigadores europeus começaram a trabalhar sobre a mobilização de conservação, mais concretamente na mobilização reduzida, tendo sido os resultados obtidos bastante prometedores.
No entanto, a técnica foi vista com muita reserva pelos agricultores europeus, os quais, altamente incentivados a produzir pela PAC com preços dos produtos agrícolas protegidos do exterior, não viram necessidade de recorrer a estas técnicas, ficando o conceito apenas restringido aos investigadores.
Portugal não foi excepção. A investigação começou nos anos 70 no Instituto Superior de Agronomia e no INIA (até à data) e depois foi acompanhada pela Universidade de Évora a partir dos anos 80. Também cá, houve reserva na adopção das técnicas por parte dos agricultores. Em meados dos anos 90, dois irmãos, agricultores, trouxeram para Portugal a técnica da mobilização na zona, técnica esta muito utilizada por agricultores das regiões frias dos E.U.A., os quais, precisando de aquecer o solo para a sementeira, optaram pela passagem de uma só alfaia de bicos, o subsolador, que mobilizava apenas a zona de sementeira, deixando a entrelinha intocável e coberta de resíduos vegetais (restolhos e palhas) da cultura anterior, o que permitia o aquecimento da faixa a semear e, consequentemente, uma melhor cama para a semente.
Além disso, dinamizaram com outros agricultores e investigadores da Universidade de Évora a constituição da APOSOLO – Associação Portuguesa de Mobilização de Conservação do Solo. Esta associação tem vindo, desde então, a apoiar e defender os agricultores, investigadores e empresas privadas no seu trabalho de adopção e adaptação das práticas inerentes à AC às diferentes realidades do nosso país.